Precisamos que o sagrado
esteja presente na nossa vida, mesmo que não tenhamos nada de religioso. E
raramente paramos para perceber a influência que tem no nosso dia-a-dia, o que
nos dá e o que nos traz.
1.
Diz quem sabe que o sagrado
e o profano se distinguem pelas perspectivas diferenciadas do espaço e do
tempo.
O espaço do sagrado é não
homogéneo e o seu tempo, além desta mesma propriedade, goza de uma
característica de descontinuidade que também não se verifica no domínio do
profano.
O sagrado carece que os
espaços sejam diferenciados, que alguns, poucos, apresentem uma qualidade
própria que não só os tornam especiais como organizadores, e mesmo fundadores,
de uma ordem de sentidos que criam a sua própria realidade. A partir daí assiste-se
ao estabelecimento dos ritos, dos gestos exactos, dos locais de culto ou de
peregrinação, por exemplo, que delimitam os territórios sagrados.
Por seu turno a
descontinuidade temporal implica um investimento de períodos e épocas
específicas. É legítimo afirmar que o tempo sagrado é reversível, já que tem de
ser «um tempo mítico primordial tornado presente» (Eliade). Dito de outro modo,
a inscrição num registo do sagrado retira-nos da normal (e profana) sequência
de acontecimentos, e abre-nos as portas a uma temporalidade única em que
eventuais repetições são, ainda assim, sempre novas formulações.
2.
Ainda que o sagrado e
profano se misturem, se imbriquem, se completem e se derramem nas nossas vidas
e nas nossas formas de ser e de fazer, o facto é que parecem conceitos
difíceis, abstractos e longínquos.
Brincamos à Páscoa e ao
Natal, aproveitamos feriados religiosos ou civis sem sombra de devoção nem
conhecimento do que se actualiza ou comemora e, de forma geral, guardamos as
nossas ideias sobre o divino num cofre confuso e atabalhoado de ideias ou
imitamos preceitos estabelecidos e despidos de qualquer valor.
Se, por um lado, carecemos
que o sagrado exista na nossa vida e penetre nos nossos quotidianos, mesmo que
exteriormente a qualquer sentimento de religiosidade, o facto é que só por
excepção reflectimos o que nos dá e o que nos traz.
Só por excepção nos deixamos
envolver, afectiva e cognitivamente pela compreensão de que a nossa necessidade
dele assenta directamente na vontade de significarmos quem somos e o que
fazemos. Nós, uns entre outros na corrente das gerações infinitas.
Fonte: Revista Notícias
Magazine
Texto/Autor: Isabel Leal,
Psicóloga
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