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sábado, 15 de junho de 2013

António Variações

Um português feito à medida de Nova Iorque


No passado dia 3 de Dezembro assinalou-se os 69 anos do seu nascimento. Barbeiro de profissão, músico por devoção, António morreu antes do tempo, no auge da sua curta carreira.

Um génio que nasceu e morreu antes do tempo

Vinte e nove anos após a sua morte, a genialidade de António variações permanece bem viva e as suas canções fazem hoje tanto ou mais sentido do que na época, confirmando que terá vivido à frente do seu tempo. Pouco percebia de música, mas tinha na intuição uma das suas principais armas. Cantava o que sentia e era através da música que assumia todas as suas diferenças, dúvidas e certezas. Quando morreu, António deixou uma série de gravações caseiras – 43 cassetes, que Jaime Ribeiro, um dos irmãos do cantor, entregou à EMI. Após alguns anos de espera, vêm a lume em humanos, um disco com as vozes de Manuela Azevedo, Camané e David Fonseca. António variações faz-lhes companhia atrav´s de um jogo invulgar de sons, ritmos e palavras.

Tenho pena de morrer, mas não medo. Tudo o que acaba me deprime. Mais pelo fim do que pelo acto em si.”
Cidadão do Mundo, nunca renegou as suas humildes origens


 
 

António Rodrigues Ribeiro nasceu a 3 de Dezembro de 1944 na aldeia de Fiscal, perto de Braga. O quinto dos dez filhos de Deolinda de Jesus e Jaime Ribeiro cedo descobre que o campo e o trabalho da lavoura não fazem parte do seu mundo, e tem apenas 12 anos quando ruma a Lisboa em busca de sonhos. Longe da sua aldeia rural, descobre tudo o que a vida tem para lhe oferecer. Experimenta vários ofícios, cumpre as suas obrigações militares em Angola, vive em Londres e depois em Amesterdão, onde aprende a profissão de cabeleireiro. Regressa a Lisboa e, depois de passar por dois salões mais conceituados da capital, abre a sua própria barbearia, no Bairro Alto. Barbeiro de dia, músico à noite, António faz-se notar pelo seu visual excêntrico e personalizado. Usa e abusa das cores fortes e vibrantes e não abdica dos adornos. Não se considerava extravagante, tudo tinha a ver com o seu insaciável desejo de libertação. Adorava viajar e escolheu o seu rumo ao sabor da aventura, apaixonando-se pela cosmopolita Nova Iorque, que sentiu como a sua “cidade gémea”. Num curto espaço de tempo torna-se uma estrela, mas não esquece nunca as suas origens, e é rara a entrevista em que não fala da família. Revela uma especial idolatria pela mãe, aquém rende uma sentida homenagem dedicando-lhe uma música com o seu nome, Deolinda de Jesus; no álbum Dar e Receber. António variações queria ficar na história da música popular portuguesa e não restam dúvidas de que conseguiu. Criticado por uns, idolatrado por outros, gerou ódios e paixões, mas nunca a indiferença.

A minha mãe é a mãe mais amiga. Certeza com que eu posso contar. E nem por isso sou a imagem que queria. Mas sempre em soube aceitar.”

Adeus prematuro


Nunca abdiquei de ser o que sou e só comecei a ser recompensado por essa atitude quando houve pessoas que vieram ter comigo e me disseram ter sido eu o ponto de partida para algo que não eram capazes de assumir.”

O cantor morreu na madrugada de 13 de Junho de 1984, poucos dias após o lançamento do seu segundo álbum. Oficialmente, António Variações morreu devido a uma broncopneumonia bilateral, mas são poucos os que duvidam que António não tenha sido um dos primeiros casos de sida conhecidos em Portugal. Nos últimos tempos da sua vida não escapou às criticas e à discriminação, e ainda hoje a família foge ao assunto. Boémio e extravagante, António nunca tentou esconder as suas opções sexuais e assumia sem complexos todas as suas diferenças. No dia do seu funeral, a Basílica da Estrela encheu-se de gente. Milhares de pessoas quiseram dar o último adeus a uma figura ímpar da música portuguesa, alguém que a morte levou antes do tempo. Mas a sua música parece ter alcançado o dom da imortalidade.


Fonte: Revista Caras
Fotos: Rui Cunha/EMI, Rui Renato/EMI, Teresa Matos Moreira /EMI, Alexandre Carvalho/EMI.
CarlosCoelho