Mostrar mensagens com a etiqueta Pintores. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Pintores. Mostrar todas as mensagens

sábado, 18 de abril de 2020

Joseph Mallord William Turner



William Turner: Auto-retrato, 1798.

Pintor e gravador inglês, nasceu a 23 de Abril de 1775, filho de um barbeiro. Começou por ser aguarelista e trabalhou com Girtin para Thomas  Monro, fazendo cópias de obras de Cozens.
Aos 14 anos já estuda na Royal Academy of Arts. Em 1791 apresenta, pela primeira vez, duas aguarelas na Royal Academy e, aos 21 anos, pinta o seu primeiro quadro a óleo. Apesar de se ter levantado a suspeição de que teria sido, em 1799, amante da actriz Sara Danby e de ter viajado muito, tendo atravessado os Alpes e passeado pela Europa continental, foi na realidade um homem solitário e muito avarento. Em 1803 abre a sua própria galeria e em 1807 é nomeado professor de perspectiva da Royal Academy, mas só em 1823 se torna A.R.A. ou seja, Academic of the Royal Academy. Morreu em 1851, num quadro debruçado sobre o Rio Tamisa.

"Paz e Enterro no Mar", Óleo sobre tela, executado em 1842, com o qual Turner hemenageia Sir David Wilkie, que morreu ao largo de Gibraltar.

A composição intitulada Paz – Enterro no Mar foi feita em homenagem ao pintor escocês David Wilkie, colega de Turner que, ao regressar da Palestina por meio de um navio a vapor, morreu próximo a Gilbratar, em 1841. Naquela época, como a peste dizimava o Oriente Próximo, o porto foi fechado, impedindo a chegada de pessoas que vinham daquela parte do planeta. David Wilkie morreu no navio e seu corpo foi lançado ao mar.

Nesta sua comovente pintura, Turner apresenta um fenômeno luminoso no céu, na água e na linha da costa longínqua, enquanto no mar jaz a escuridão do navio com suas velas içadas, solto e sem rumo sobre as águas.
Uma luz forte e dourada, proveniente dos archotes que iluminavam o corpo de Wilkie no momento em que esse estava sendo entregue ao mar parece separar o escuro navio em duas partes, como se aquilo fosse algo divino e sobrenatural.


O museu do Prado, em Madrid, acolheu a primeira exposição de grandes dimensões de Turner em Espanha em 2010. Esta exposição que antes passou por Londres e Paris, apresentou algumas novidades, mantendo o principio do diálogo num universo de 80 obras, metade de Turner e outra metade de grandes mestres, como Rubens, Rembrant, Canaletto e Constable, nos quais se fundamentou ou deixou influenciar.
Mestre da paisagem e do romantismo britânico, estudou em profundidade esses mestres, mas conseguiu imprimir uma linguagem original, criando não só tensões, mas exacerbando uma imagem emocional e uma plasticidade que o posiciona como percursor do Impressionismo. Linguagem essa quase tátil, nas texturas insólitas, expressionistas, por vezes raiando o abstracionismo e sempre próximas do Impressionismo e que se traduzem em paisagens aquosas, com torvelinhos de cores expandidas e de luz. Pintava com recurso a uma técnica matéria, pastosa, que pode parecer rude, mas afinal cheia de matrizes e velaturas que hoje vemos como antecipações de outras linguagens plásticas.
Intensamente privado, excêntrico e recluso, Turner foi uma figura controversa ao longo da sua carreira. Ele não se casou, mas teve duas filhas, Eveline (1801–1874) e Georgiana (1811–1843), ambas por sua governanta Sarah Danby. Ele ficou mais pessimista e moroso quando ficou mais velho, especialmente após a morte de seu pai, ao que sua visão se deteriorava, a sua galeria caiu em desuso e negligência, mas a sua arte intensificou-se. Ele viveu na miséria e com saúde precária em 1845, morreu em Londres em 1851 aos 76 anos. Turner está enterrado na Catedral de Saint Paul, em Londres.
Ele deixou para trás mais de 550 pinturas a óleo, 2.000 aquarelas e 30.000 obras em papel. Ele foi amplamente defendido pelo principal crítico inglês da época, John Ruskin, em meados de 1840; hoje é considerado como detentor de uma pintura paisagista sofisticada, elevada a uma eminência que rivaliza com a pintura histórica.

Algumas das suas obras


Naufrágio de um Cargueiro

Naufrágio de um Cargueiro é uma pintura a óleo sobre tela do pintor inglês Joseph Mallord William Turner de cerca de 1810 e que se encontra actualmente no Museu Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

A composição de O Naufrágio de um Cargueiro destaca o próprio evento do naufrágio, muitas vezes considerado como sendo do navio Minotauro o que causou confusão, evento que ocupa o primeiro plano da imagem, em contraste com a obra anterior O Naufrágio de 1805 (em Galeria).
Turner executou várias pinturas de grandes dimensões na década iniciada em 1800 em que representava catástrofes naturais e tempestades no mar, tendo iniciado em 1801 com The Bridgewater Sea Piece (de Coleção Particular em depósito na National Gallery, Londres, também em Galeria) e o referido O Naufrágio (Tate Britain, Londres) com o qual a obra da Gulbenkian apresenta semelhanças evidentes.


Tempestade de Neve

Tempestade de Neve: Aníbal e o seu Exército a Atravessar os Alpes (Snow Storm: Hannibal and his Army Crossing the Alps) é uma pintura a óleo sobre tela do mestre inglês J. M. W. Turner, e que foi exibida ao público pela primeira vez em 1812.
A tela aborda a fragilidade humana ante as forças da natureza, sendo a própria composição um redemoinho. Turner volta a utilizar a idéia de vórtice, numa encenação do terror que se apossa do homem ante a grandiosidade da natureza. Montes altíssimos e blocos de neve fustigam a presunção humana que ousou desafiá-los. O sol é um pálido círculo distante, como que um olho indiferente a observar a audácia do homem diante da inclemência do tempo.
Deixada ao património público nacional pelo Turner Bequest, ficou primeiro na National Gallery tendo em 1910 transitado para a Tate Gallery onde permanece atualmente.


Dido erguendo Cartago, ou O Nascimento do Império Cartaginês

Dido erguendo Cartago, ou O Nascimento do Império Cartaginês (Dido building Carthage, ou The Rise of the Carthaginian Empire), é uma pintura a óleo sobre tela de 1815 do mestre inglês J. M. William Turner.
Esta pintura é uma das obras mais importantes de Turner que foi muito influenciado pelas paisagens clássicas luminosas de Claude Lorrain. Turner classificava-a como a sua obra-prima.
Foi apresentada ao público pela primeira vez na exposição de verão da Royal Academy de 1815, tendo Turner mantido esta pintura na sua posse até que foi integrada no espólio nacional inglês através do Legado de Turner (Turner Bequest). Tem feito parte do acervo da National Gallery (Londres) desde 1856.


Quillebeuf, na Foz do Sena

Quillebeuf, na Foz do Sena é uma pintura a óleo sobre tela do pintor inglês Joseph Mallord William Turner de 1833 e que se encontra actualmente no Museu Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
O quadro representa a frente portuária da povoação de Quillebeuf, perto do estuário do Sena, local que Turner visitou no decurso da década de 1820. O quadro foi apresentado publicamente na Royal Academy, em 1833, com uma nota no catálogo da exposição a alertar para os perigos de navegação decorrentes da subida brusca da maré e para o irromper súbito de uma enorme onda, um macaréu, fenómeno conhecido entre a população da região por mascaret ou barre.


The Fighting Temeraire

The Fighting Temeraire é uma pintura do artista inglês J. M. W. Turner. Mostra o navio HMS Temeraire, que participou da Batalha de Trafalgar em 1805, sendo rebocado para seu ancoradouro final em Rotherhithe, no sudeste de Londres, em 1838 para ser sucateado. A pintura é exibida na National Gallery, Londres, tendo sido doada à nação em 1851 pelo artista. Em 2005 foi eleita a pintura favorita dos britânicos numa pesquisa organizada pela BBC.
O Commons possui uma categoria contendo imagens e outros ficheiros sobre The Fighting Temeraire
Quando Turner pintou este quadro, o artista estava no auge de sua carreira, tendo ficado famoso por suas pinturas de perspetiva atmosféricas em que explora os assuntos do tempo (meteorológico), do mar e dos efeitos da luz. Ele viveu grande parte de sua vida nas margens do rio Tâmisa e fez muitas pinturas de navios e cenas da água; fazia pequenos esboços para posteriormente trabalhar a pintura no estúdio.
Os especialistas acreditam que muito provavelmente Turner não presenciou o reboque do Temeraire e que usou as suas liberdades criativas para a criação do quadro. Quando a Grã-Bretanha entrou nas guerras napoleônicas Turner tinha apenas dezoito anos, o que provavelmente despertou nele um forte sentimento patriótico. O Temeraire foi um navio muito conhecido devido ao seu desempenho heroico na batalha de Trafalgar e a sua venda pelo Almirantado tinha atraído uma cobertura considerável da imprensa da época, o que teria chamado a atenção do artista.
A pintura aparece durante o filme 007 Skyfall (2012) na cena em que o agente secreto James Bond (Daniel Craig) conhece o agente Q (Ben Whishaw). Nesta cena, Bond aguarda o contramestre na National Gallery enquanto contempla a pintura.


Fonte: Revista Caras /Arte por Jùlio Quaresma,
Fotos da net
© Carlos Coelho

domingo, 1 de janeiro de 2017

Leonardo Da Vinci

Códigos. Os segredos  do maior artista de sempre. 
A vida misteriosa de Da Vinci


(Autoretrato de Leonardo)
Sete anos depois de ter recebido a encomenda, deu os últimos retoques no quadro. Era um retracto de meio corpo, tipicamente renascentista, um clássico da iconografia de Jesus Cristo, repetido inúmeras vezes até então. Mas Leonardo Da Vinci, 61 anos estava satisfeito com o resultado. A mão direita erguida em sinal de bênção e o globo sob a palma esquerda estavam lá, respeitando a tradição. Mas o seu Salvator Mundi era diferente. A esfera que representa a Terra não era o convencional globus cruciger que Ticiano, Antonello de Messsina e tantos outros tinham pintado – translucida, em vez de uma cruz no topo tinha três pintas brancas, em forma de triângulo, à superfície. E o rosto de Cristo, que ensaiou pelo menos duas vezes em papel com cabelos aos caracóis, tinha traços femininos. Entregou a encomenda. Só não se sabe a quem. Seis anos depois estaria morto.

(O Salvator Mundi perdido desde 1763 e encontrado em 2005. Em 1958, o Salvator Mundi foi vendido por 45 libras. Hoje vale 137 milhões de euros.)

Pelo menos durante o último século, o paradeiro de Salvator Mundi de Da Vinci foi um mistério. Os especialistas sabiam que tinha sido pintado (para Luís XII de França ou para o mecenas italiano Gian Giacomo Trivulzio) porque foram encontrados estudos para o quadro nos manuscritos de Leonardo e porque vários discípulos do mestre o tinham reproduzido. Mas acreditavam que a pintura teria sido destruída ou perdida para sempre – a partir do século XVIII, o percurso do pedaço de madeira de 65cm por 45cm, que em 1649 foi registado na colecção particular de Carlos I de Inglaterra, tornou-se impossível de reconstruir.

(Desenho de época)

Depois de ter visto o pai ser executado, Carlos II herdou o Salvator Mundi e uns anos mais tarde ofereceu-o ao duque de Buckingham. Quando o filho do nobre leiloou a pintura, em 1763, o rasto perdeu-se. Em 1900, num leilão no Reino Unido, apareceu um quadro que era parecido. Estava em péssimo estado mas, ainda assim, o coleccionador Frederick Cook resolveu licitá-lo. Terá sido o único a acreditar que tinha um verdadeiro Leonardo nas mãos, mesmo quando os especialistas da época concluíram que não passava de uma cópia do original, feita por Giovanni Boltraffio. Em 1958, os seus herdeiros venderam-no por apenas 45 libras.




(Interiores do Clos Luce, castelo ligado por uma passagem subterrânea à residência do Rei Francisco I, onde Leonardo se instalou em 1515, quando se mudou para o Vale do Loire, como convidado real. Passou  os últimos quatro anos em França. Foi sepultado na capela do castelo.)

Em 2005, o quadro reapareceu muito degradado e coberto de inúmeras camadas de tinta e verniz. Foi submetido a testes intensivos e à análise dos maiores especialistas mundiais da obra de Da Vinci. Em Julho do ano de 2011, estes chegaram à conclusão: é o original de Leonardo e estava avaliado em 137 milhões de euros. Ficou pela primeira vez em exposição em Novembro de 2011 na National Gallery, em Londres.
Apesar de ter documentado grande parte do trabalho que fez nos, seus famosos códices, a obra de Leonardo permanece um mistério. Ao longo de toda a vida, terá completado pouco mais de 20 quadros e frescos (acredita-se que pelo menos 10 estejam desaparecidos) e a maioria das suas esculturas perdeu-se sem que ninguém as tivesse visto. Da Vinci pintou poucas obras e passava vários anos (por vezes décadas, como aconteceu com Mona Lisa) a trabalhar nelas até estarem perfeitas. Mas deu-se ao trabalho de pintar o mesmo quadro duas vezes.



Aconteceu com a Virgem dos Rochedos – existem duas, uma no Museu do Louvre, a outra na National Gallery. Estiveram ambas lado a lado pela primeira vez, na exposição de Londres. Foi então mais fácil perceber as diferenças que fizeram com que a primeira versão tivesse sido recusada pela Confraria da Imaculada Conceição, que encomendou o trabalho.
Segundo Sarah B. Benson, do Departamento de Arte e Arqueologia da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, “um dos motivos que fizeram com que a primeira tela fosse rejeitada foi o aparecimento no cenário, atrás dos personagens, de plantas utilizadas em rituais pagãos”. A encomenda previa que o artista apresentasse Nossa Senhora e o Menino, rodeados por anjos e profetas, mas Leonardo pintou um episódio que nem sequer vem descrito na Bíblia. 


Trata-se do encontro de Cristo com o jovem São João Baptista, numa gruta a meio do caminho, quando a Sagrada Família fugia para o Egipto, depois de ter sido avisada pelo anjo de que Herodes ordenara o massacre de todos os recém-nascidos em Jerusalém. O encontro só foi relatado num dos evangelhos apócrifos, escritos por autores desconhecidos, nos primeiros séculos do cristianismo, e nunca reconhecidos pela Igreja Católica.
Além das plantas utilizadas em rituais heréticos, Da Vinci excluiu São José; pintou São João Baptista sem a tradicional cruz de madeira e mais próximo da Virgem Maria do que o próprio Menino Jesus, como se estivesse sob a sua protecção; e desenhou o arcanjo Uriel com um dedo esticado, como se estivesse a fazer o sinal de decapitação, defendem alguns estudiosos. Outros, como os críticos de arte John Ruskin e Walter Pater, acrescentaram ainda, no início do século XIX, que a forma andrógina que o pintor deu ao arcanjo é prova inequívoca da “decadência de Leonardo e das suas actividades homossexuais”.



Apesar de haver registos que defendem que Leonardo só pintou uma segunda Virgem dos Rochedos porque vendeu a primeira a outro comprador, a dúvida mantem-se: porque mudou tanto, de uma pintura para a outra? É que, apesar de terem o mesmo nome, e de à partida serem semelhantes, os dois quadros são muito diferentes. “ Nunca saberemos o que Da Vinci queria realmente dizer com alguns elementos. O facto é que na segunda versão do quadro estes foram tirados ou suavizados”, explica Benson.


Este episódio reforça a tese de que, apesar de todo o seu trabalho no campo da pintura religiosa, Leonardo Da Vinci não acreditava em Deus e poderá ter estado ligado a grupos secretos anticatólicos. Esta desconfiança vem de Longe: Na primeira edição de A Vida dos Artistas, de 1550, Giorgio Vasari, um dos seus primeiros biógrafos, garantia que o artista era herege. Mas na segunda edição, publicada 18 anos depois, Vasari apagou a frase polémica: “O seu espírito era de uma natureza tão herética que nunca aderiu a nenhuma religião, pensando talvez que fosse preferível ser um filósofo a ser um cristão.”




Certo é que Da Vinci sempre viveu á margem das regras rígidas da Igreja e fez experiências consideradas “negras” na época. Há registos de que, ao longo de toda a vida, o artista terá aberto e estudado cerca de 30 cadáveres dentro da própria casa, muitas vezes de madrugada. Num dos seus cadernos escreveu até sobre o “medo de passar a noite na companhia destes homens mortos, desmembrados, esfolados, horríveis de ver”.

(Anatomia, Gravidez. Foi o primeiro a descrever a localização exacta do feto no útero. Com um senão: desenhou a placenta múltipla de uma vaca e os seres humanos têm só uma.)

A actividade permitiu-lhe chegar a conclusões inéditas sobre o funcionamento e organização do corpo humano e a questionar ideias defendidas pela igreja. Nos seus códices, Leonardo descreveu o sistema vascular e desenhou esboços fidedignos de músculos e órgãos, mas também aludiu ás semelhanças entre primatas e humanos. 

(Dissecações, Heresia. Da Vinci autopsiou 30 cadáveres. Catalogou todos os ossos do corpo humano e descreveu os mecanismos que os fazem mover.)

Entre as mais de cinco mil páginas que resistiram até á actualidade, contam-se ainda os estudos de Leonardo para as suas esculturas (como o gigantesco cavalo Sforza, que projectou para o Duque de Milão, mas nunca chegou a construir) e todos os detalhes para a criação das suas visionárias invenções: há 500 anos, projectou pára-quedas, escafandros, tanques de guerra, máquinas escavadoras, catapultas e até uma espécie de precursor do helicóptero. Todas essas notas foram, como era seu hábito, escritas da direita para a esquerda, e com as letras invertidas, como se estivessem pensadas para serem lidas em frente a um espelho.

(Engenheiro, Armas. Desenhou uma besta gigante e um tanque de guerra. Até idealizou as primeiras bombas de fragmentação.)

A escrita especular é um dos maiores mistérios da vida de Da Vinci. Alguns historiadores acreditam que o fazia porque era canhoto e autodidacta e preferia escrever ao contrário para não borrar a tinta com a mão. Outros defendem que não queria que os seus apontamentos fossem decifrados por pessoas ligadas á Igreja Católica. Michael White, ex-editor de política do Jornal The Guardian e autor de Acid Tongues and Tranquil Dreamers: Eight Scientific Rivalries that Changed the World, não tem dúvidas: “Leonardo era paranóico, em parte por boas razões. Havia os que queriam plagiar as suas ideias, rivais que chegaram a colocar assistentes no seu estúdio para o roubarem, e havia os espiões de Roma, sempre á espera que ele se descuidasse.”

(Visionário, "Helicóptero". Foi uma das obsessões, voar. Também desenhou um ornitóptero. Nenhum saiu do chão.)

Estes factos ajudam a teoria de que o pintor terá sido um dos mais importantes grão-mestres de uma misteriosa sociedade secreta, o Priorado de Sião, cujo objectivo seria perpetuar e divulgar um dos maiores segredos da humanidade Jesus teria casado com Maria Madalena e tido um filho com ela. Essa descendência humana de Cristo era na verdade o que se escondia, explicam Henry Lincoln, Michael Beigent e Richard Leigh em The Holy Blood and the Holy Grail, por trás do símbolo do Santo Graal.

(Um Cavaleiro Templário aparece no topo da mesa, do lado esquerdo. Do Lado esquerdo de Cristo, a experiência revela uma mulher com um bebé ao colo.)

(À frente de Jesus surge um cálice tombado. Tiago está a olhar para ele. O Italiano Slavisa Pesci inverteu a imagem da Última Ceia, como se esta estivesse à frente de um espelho, e colocou-o por cima do original. Resultado: foram reveladas figuras ocultas no fresco.)

Esse segredo revelou o italiano Slavisa Pesci em 2007, pode ter sido ocultado pelo pintor florentino num dos seus mais famosos frescos. Para o estudioso amador. A última Ceia, que sempre foi alvo de controvérsia (existe uma corrente que defende que o apóstolo João, o único imberbe representado, seria na realidade Maria Madalena), não é apenas a visão de Da Vinci sobre o momento em que Jesus revela aos seus seguidores que foi traído por um deles. Invertendo uma cópia do quadro e colocando-a por cima do original, Pesci descobriu imagens escondidas no desenho: vários cavaleiros templários, com as cabeças cobertas por cotas de malha ou elmos, e uma mulher, com um bebé ao colo.
Pesci garante que os desenhos ocultos no fresco a que Leonardo se terá dedicado entre 1495 e 1498 (e que 20 anos depois já se começava a deteriorar, fruto de uma mistura de óleo e têmpera que não correu bem) comprovam a crença do pintor na descendência de Cristo.




(Alguns esboços da Ceia de Cristo)

Não é a única referência ao assunto encontrada pelos símbologistas na obra de Leonardo. Porque entretanto mudava de ideias ou porque tinha intensão de ocultar mensagens e significados, raros foram os quadros do génio florentino que não tiveram várias camadas de tinta. Em 2005, Maurizio Seracini, um dos maiores especialistas mundiais na obra de Leonardo, revelou que A adoração dos magos não é apenas uma recriação de mais um episódio bíblico, o da visita dos Reis magos à Virgem e a Jesus recém-nascido. Mais: revelou que a pintura terá sido começada por Da Vinci, mas alguém a terá acabado, pintando por cima e ocultando várias imagens da versão original.


Por baixo da camada superior do quadro, com recurso a raios X, fotografias digitais de alta definição e raios ultravioleta e infravermelhos, Seracini descobriu novos elementos escondidos. Atrás da mais recente tecnologia, o investigador revelou que no lado esquerdo do desenho, onde antes parecia existir apenas um edifício destruído, Leonardo desenhou operários escondidos.



De acordo com o especialista, a presença de trabalhadores naquele que era um templo pagão revela uma intensão de Leonardo: mostrar que o templo está em processo de reconstrução. Por que motivo o fez, ninguém sabe. Apesar de tudo apontar para que o Priorado de Sião não passe de uma farsa criada em 1956 por um francês chamado Pierre Plantard, há quem acredite nessa tese: o edifício representaria a dissolução e a consequente reedificação encapotada da Ordem dos Cavaleiros Templários, o braço armado do Priorado de Sião, que ainda hoje defenderá o segredo do Santo Graal.



Questionado pelo Guardian sobre se teria sido o próprio Leonardo a cobrir o trabalho, por saber que como estava não iria ser aceite pelos monges de São Donato de Scopeto, que lho tinham encomendado, Seracini recusou-se a comentar: “Os historiadores de arte, é que têm de o dizer. Mas eu não excluiria a hipótese.” É bastante provável. O especialista italiano descobriu cerca de 70 novas figuras por baixo d’A Adoração dos magos: há cavalos, um boi e um burro na manjedoura, inúmeros rostos dispersos, muitos ameaçadores, e uma cena de batalha a cavalo, no canto superior direito.
Em 2008, O argentino Hugo Conti dedicou-se a estudar os códigos e mensagens que poderão estar escondidos nas pinturas de Leonardo Da Vinci. 


As conclusões a que chegou são, no mínimo, perturbadoras. Utilizando apenas um espelho, o investigador, líder de uma organização obscura chamada O espelho das sagradas Escrituras e Pinturas, descobriu uma série de imagens ocultas em quadros do pintor. “É fácil encontrar imagens invisíveis nas pinturas de Leonardo. Muitas das suas personagens parecem estar a olhar para o vazio. Na verdade, estão a indicar o local onde se deve colocar o espelho para ver as imagens”, explicou ao Discovery News. O método funciona, mas não para os quadros onde Da Vinci retractou personagens com dedos a apontar – neste caso, é no indicador que deve ser colocado o espelho.
Os resultados do estudo, que o Vaticano disse na altura precisar de “provas sólidas”, bem como do aval de críticos de arte, são intrigantes. No ombro de Mona Lisa, o quadro mais famoso do pintor, pode ver-se a imagem de uma figura com um capacete, estranhamente semelhante a um guerreiro. Exactamente a mesma imagem que surgiu quando o teste foi aplicado à Virgem com o Menino e Santa Ana. Hugo Conti explicou: tratar-se-iam de duas representações de Javé, deus descrito no Antigo Testamento e que alegadamente simboliza a “luta da mente humana contra os Vícios do corpo”.


Em Baco, a imagem oculta também é uma referência às Sagradas Escrituras: um corpo com quatro pernas, misto de homem e mulher. De acordo com Conti, trata-se da Árvore da vida no jardim do Éden: “Todas estas imagens bíblicas escondidas estão relacionadas com uma mensagem secreta deixada pelo artista. Representam alegorias do Génesis e do Novo Testamento e abrem as portas a uma nova forma de interpretar as suas obras.”
Embora os especialistas se tenham mostrado cépticos, a imagem gerada pelo reflexo de A Última Ceia reforça uma série de outras teorias. Entre as mãos de Jesus, exactamente no sítio para onde Tiago dirige o olhar, aparece um cálice deitado: “O apóstulo Tiago não está a fixar Judas, mas o lugar onde o Santo Graal, visível apenas através de um espelho, está tombado na mesa.”


Em 1506, Leonardo Da Vinci abandonou o fresco da Batalha de Anghiari que estava a pintar numa das paredes do Salone dei Cinquecento, no Palazzo Vecchio, de Florença. Era uma pintura grandiosa e violenta, com cavalos possantes e soldados furiosos de espadas em punho. Mesmo inacabada, era uma obra admirável, copiada repetidamente por discípulos de Da Vinci.
Depois, em menos de meio século, a tinta começou a soltar-se das paredes – não se sabe se foi mais uma experiência que correu mal ou se a culpa foi de Francesco Nuti, merceeiro, que lhe vendeu óleo de linhaça adulterado. Em 1563, o fresco estava na iminência de se perder para sempre. Foi nessa altura que Giorgio Vasari recebeu uma encomenda por parte dos Medicis, entretanto regressados ao poder: pintar nas mesmas paredes a batalha de marciano, que opusera nove anos antes, na Toscana, os exércitos de Florença e Siena. Aceitou o trabalho. E o fresco de Leonardo desapareceu.
Por que Motivo terá Vasari pintado por cima do trabalho de Leonardo? O investigador Charles Nicholls não deslinda i mistério: “Há duas coisas que se podem inferir, uma pessimista, outra optimista: que, na opinião de Vasari, nada se via que valesse a pena conservar; ou então que tomou medidas para proteger o que lá estava antes de começar a pintar.”
A má notícia? O fresco perdeu-se mesmo. A boa? Tudo aponta para que o biógrafo soubesse perfeitamente o que estava a fazer. Mais uma vez, foi Maurizio Seracini quem descobriu tudo. A busca durou 35 anos. Desde a década de 70 do século passado que o director do Centro de Ciência Multidisciplinar da Arte, Arquitectura e Arqueologia da Universidade da Califórnia viveu obcecado com os relatos sobre os magníficos cavalos de Leonardo (que subsistem através de várias cópias dos estudos para o original, a mais conhecida será a de Rubens).
Em 2005, encontrou o que procurava: o fresco perdido, de Leonardo, estava mesmo por baixo da Batalha de Marciano, pintada por Vasari. Por meio de radares e equipamentos de raios X, o especialista descobriu uma pequena câmara-de-ar, de não mais de três centímetros, que separa a pintura de Vasari do mural de Leonardo Da Vinci.
O município de Florença e o Ministério da Cultura italiano autorizaram, em 2007,  que o especialista prosseguisse as investigações. Seracini esta actualmente a trabalhar em parceria com um fotógrafo e um cientista nuclear, no desenvolvimento de uma câmara de rais gama, capaz de detectar pigmentos atrás do fresco de vasari. O problema: as despesas ascendem a 190 mil euros e, até á data, nenhum patrocinador ofereceu tanto ( o fotografo david Yoder e a National Geographic até lançaram uma campanha de angariação de fundos para viabilizar o projecto).


Fascinante foi a forma como Maurízio Seracini resolveu o mistério e teve a certeza de que estava a procurar o mural perdido no sítio certo. Depois de horas a estudar o fresco de Vasari, descobriu uma mensagem enigmática numa das dezenas de bandeiras pintadas no quadro, composto por uma imensidão de corpos, espadas e lanças, No topo do fresco, a cerca de 12 metros do chão, o especialista encontrou uma bandeira, carregada por um soldado florentino. Sobre o verde, a tinta branca, o especialista conseguiu ler, apenas com a ajuda de binóculos, duas palavras, com não mais de dois centímetros e meio de altura. Uma mensagem disfarçada por Giorgio Vasari para os especialistas do futuro: “Cerca Trova” – Procura e Encontrarás.

Fonte: Revista Visão
Texto: Tânia Pereirinha
Fotos da Net
𺰘¨¨˜°ºðCarlosCoelho𺰘¨¨˜°ºð

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

René Magritte

A Caixa negra de Magritte

O pintor surrealista que transfigurava objectos quotidianos, tem uma nova casa. Um museu com o seu nome, em Bruxelas, com alguns quadros que nunca reconheceríamos como “magrittianos”. A casa de um homem é como a sua alma: diversa


A metáfora arquitectónica assenta como uma luva a René. O Museu Magritte, inaugurado em Junho de 2006, é um grande edifício de linhas clássicas e janelas quadradas, dispostas em fileiras obedientes, que, no interior, se transfigura radicalmente em caixa negra. Como um cara e coroa a três dimensões. Um L’Empire des Lumières em escala rebentada.
Recordam-se deste quadro? Mostra a paisagem serena de uma rua, com uma casa semioculta no arvoredo, um céu de dia claro, pintado em cima, em baixo as cores de uma noite iluminada, por um candeeiro público. Um enigma pictório que levanta a pergunta «é isto possível?» aos espectadores. A realidade do mundo é, afinal, a aceitação do mistério, patente em muitos trabalhos do pintor. 

L’Empire des Lumières

L’Empire des Lumières está declinado em duas versões, uma de 1954, outra de 1961, na exposição patente no Museu: um mundo dividido em cinco andares, onde se  abriga a maior colecção de pinturas de René François Ghislain Magritte, o belga nascido na cidade de Lessines, a 21 de Novembro de 1898. Surrealista discreto, capaz de grandes rasgos.
Esse é o verdadeiro truque de prestidigitação, não a fachada renovada do antigo hotel Altenloh, na Place Royale. Nem as imagens mais conhecidas do artista que defendia que a realidade não era algo em que se pudesse confiar. Magritte desenhou objectos de contornos realistas em cenários oníricos, desarrumados em paradoxos ou contradições. 


Ele é  o artista que pintou um célebre cachimbo com a legenda Ceci N’est Pas une Pipe («Isto não é um cachimbo»). Não era um cachimbo, porque não se podia fumar com ele, linguagem provocatória para recordar que a   representação  de um objecto nunca é o próprio objecto. 

La Durée Poignarde

Dele são também os quadros em que um comboio fumegante sai de uma vulgar chaminé (La Durée Poignarde) desenhada a partir da que se encontrava na sala de estar da sua casa. 

Black Magic, 1945

Ou aqueles em que o corpo nu de uma mulher se funde num céu de nuvens brancas (Black Magic, 1945). Ou ainda as imagens em que homens de chapéu de coco e sobretudo descem dos céus ou se apresentam de rosto ausente ou tapado por uma maçã. Cite-se o pintor belga para ajustar os binóculos que permitem entender este universo: «Ver é um acto.» Ainda que o próprio René, enquanto estudante de artes, tinha ido visitar o Museu Ufizzi, em Florença, lá permanecendo apenas meia hora entre obras-primas e explicando que era bom, mas que «os postais também funcionavam».

Visitações

É de outra ordem o jogo de ilusão provocado pela visita ao excelente Museu Magritte. Não sai nem de uma cartola de mágico nem de um qualquer chapéu de coco. Revela-se na surpresa de encontrar coisas novas num universo que se pensava já decifrado, repetido e esgotado em muitos postais. Há lugar para a ampla divulgação, por exemplo, da sua obra gráfica, quando trabalhou com o irmão antes de o sucesso chegar, cartazes publicitários ou ilustrações para partituras de música, de surpreendente eficácia. Ou para uma selecção de retratos dedicados a  patronos e amigos, mulheres loiras bizarramente sorridentes, mecenas que lembram sábios gregos. Há até a encomenda da companhia aérea Sabena, um óleo que mostra uma pomba a sobrevoar uma pista de aterragem, em L’Oiseaux de Ciel (1966).

L’Oiseaux de Ciel (1966

No espaço, pontuado por fotografias e citações nas paredes do próprio Magritte, o artista é-nos  dado num permanente jogo de revelações e ocultações. Em recantos inesperados, há manuscritos e filmes de época mostrando as brincadeiras domésticas com os amigos e a mulher, Georgette – fiel a todas as horas, de quem o museu mostra retratos da jovem lindíssima que era. Por ela, doente em Bruxelas num período difícil em que a guerra devastava a Europa, Magritte virá do Sul de França onde se refugiara, a primeira parte da viagem feita de bicicleta. 

Georgette 

Com medo e remorso. Há , aqui, quadros que contam essa história: arbustos de aves feridas e mochos vigilantes, como os povos mal tratados; ou a leveza do grande pássaro de nuvens a sobrevoar um ninho de Le Retour (1940).

Le Retour (1940

Há que andar entre andares organizados cronologicamente, e entre as esquinas desta caixa negra para ver estas obras, muitas delas que não se associaram à sua produção fortemente inspirada no quotidiano – nem que seja no dos sonhos deste rapazinho de família pobre, que aos 12 anos descobriria o corpo da mãe, fazedora de chapéus, que se suicidara. Sobe-se pelo elevador, cujos andares se vão revelando partes de um corpo: primeiro piso, uns pés. Depois, joelhos, um sexo feminino, uns seios, até chegar a  um rosto de mulher, última paragem, o topo do seu mundo. É esse o lugar onde decorrerão as exposições temporárias do espólio vasto: aqui está a produção integral das obras de Magritte, desde os anos académicos até ao último trabalho que deixou incompleto. O pintor seria primeiro influenciado pelo  construtivismo até ter uma epifania, em 1923, ao conhecer o trabalho de Georges de Chirico – talvez o primeiro pintor a abrir caminho para o território dos sonhos. É fácil de ver esse impacto no quadro L’Homme du Large (1927), uma silhueta sem rosto. 

L’Homme du Large 1927

Influenciado pelo cinema e pela literatura de Poe, Stevenson e Fantomas, passa pelo chamado Período Negro. Mas Magritte descobriu-se Magritte depois, com o manifesto surrealista proclamado em 1924 por André Breton. E nós descobrimos outro Magritte, ainda depois da ruptura com o escritor francês.

Experiências

Magritte fará a sua própria interpretação do pensamento sem travões morais do surrealismo, mesmo estando próximo do movimento: por exemplo, convidava o grupo para baptizar os seus quadros.

La page Blanche 

La page Blanche foi alterado por causa deles: a lua crescente passou a ser uma lua cheia pintada sobre os ramos das árvores, coisa impossível. A ruptura, brutal com o surrealismo, foi provocada também por aquilo a que alguns chamam o Período Renoir de Magritte: quadros próximos do universo impressionista, de cores vivas e traços arrastado de pincel, sóis que giram como os girassóis de Van Gogh, mulheres arco-íris que descansam na relva, árvores narigudas e fantasistas como fábulas infantis. A raiva causada pelo repúdio originou o que é, no museu, uma parede de grande impacto: convulsão de caricaturas e borrões de tinta em cores ácidas mas sem alegria, alinhada em cerca de 40 quadros, feita por Magritte em menos de 15 dias, e a que se chamou o Período Vache. A inspiração foi buscá-la a uma subversão dos comics, na altura uma produção bem-comportada. Magritte olha para  artistas cáusticos, expressionistas antes de tempo. No fim da parede, há um quadro com outro tom: La Part du Feu (1948), o que se tem de abandonar para atingir algo de maior. 

La Part du Feu 1948

Uma mulher estende um prato a um homem deitado numa cama com um candelabro aos pés, alusão a uma última refeição. É-nos dito que talvez Magritte queira representar o funeral do surrealismo que ele tanto amou.
René Magritte defendia que as suas pinturas eram concebidas «como so sinais físicos da liberdade de pensamento». 

Le Domaine d’Arnheim 1962

E é em nome dessa liberdade, que no fim da caixa negra, atordoados por tantos símbolos e imagens oníricas, esmagados por esse quadro imenso da montanha  em forma de águia de Le Domaine d’Arnheim (1962) e confrontados com a palavra «rêve» («sonho») numa edificação de pedra em L’art de La Conversation(1950), é-nos lembrado que a interpretação que verdadeiramente interessa, e lhes interessava, é a de que olha. A nossa.

L’art de La Conversation 1950


Fonte: Revista Visão
Texto: Silvia Souto Cunha
Fotos : Revista Visão / Net
𺰘¨¨˜°ºðCarlosCoelho𺰘¨¨˜°ºð