Manuel de Arriaga foi o primeiro Presidente
eleito da República Portuguesa, no dia 24 de agosto de 1911. Tinha 71 anos e
era um dos nomes mais prestigiados do republicanismo.
Devido às crescentes rivalidades e lutas
internas entre os republicanos, Manuel de Arriaga acabaria por renunciar ao
cargo, a 29 de maio de 1915, três meses antes do final do mandato.
Manuel José de Arriaga Brum da Silveira
nasceu na cidade da Horta, Açores, a 8 de Julho de 1840, filho de Sebastião de
Arriaga Brum da Silveira e de Maria Antónia Pardal Ramos Caldeira de Arriaga,
oriundos da pequena nobreza local.
A 12 de Outubro de 1861, Manuel de Arriaga
partiu para o continente, ingressando no curso de Direito da Universidade de
Coimbra. Em 1866 concluiu o bacharelato e em 1875 a licenciatura.
(Foto - Lucrécia de Brito Berredo Furtado de
Melo, mulher de Manuel de Arriaga. 1912)
Em 1874 casou com Lucrécia de Brito Furtado
de Melo, de família oriunda da Ilha do Pico, de quem teve seis filhos.
Atividade profissional
Depois de terminar o bacharelato em Leis,
Manuel de Arriaga viveu entre Lisboa e Coimbra, privando com nomes da
intelectualidade portuguesa como Antero de Quental, Oliveira Martins, Luciano
Cordeiro, Eça de Queiroz e Batalha Reis.
(Foto - Residência do Presidente da República
Manuel de Arriaga, na rua de São Francisco da Paula, atual rua Presidente
Arriaga, esquina com a travessa do Olival a Santos. 1910-1920)
(Foto - O Presidente da República Manuel de
Arriaga, sentado, ao centro, com membros do Governo presidido por Bernardino
Machado, à direita do Presidente, na atual Sala Império do Palácio de Belém. Nesta
época, conservava, ainda, parte da decoração da Sala do Bilhar do tempo de D.
Carlos. 1914)
Em 1875 abriu escritório de advogado em
Lisboa (Rua da Prata), actividade que exerceu em simultâneo com a de professor
de inglês no Liceu Central de Lisboa (mais tarde, Liceu Passos Manuel). No ano
seguinte, integrou a comissão de reforma da educação secundária, pelo Liceu
Central. Em 1878 tentou iniciar uma carreira no ensino superior,
candidatando-se a um lugar no Curso Superior de Letras, mas foi preterido em
favor de Consiglieri Pedroso. Nesse mesmo ano, foi convidado para ser professor
dos príncipes D. Carlos e D. Afonso, cargo que recusou por motivos
político-ideológicos. Dois anos mais tarde, foi excluído do Liceu Central
devido a uma alteração da legislação de contratação de professores. Como
advogado, defendeu vários clientes em processos de cariz político e de
liberdade de imprensa.
(Foto - O Presidente da República Manuel de
Arriaga e o seu filho e secretário, Roque Manuel de Arriaga, na varanda do
Palácio de Belém. 1912-08)
Dedicou-se, em paralelo, à escrita,
publicando o primeiro livro de poemas em 1887 (“Canto ao Pico”). Em 1897
terminou o romance “Síntese Suprema, a um Mundo novo, a uma Alma nova” (nunca
publicado); em 1899 publicou “Cantos Sagrados” (poesia); em 1901 “Irradiações”
(poesia) e em 1907 “Harmonias Sociais. O problema humano e a futura organização
social. A Paz dos Povos.”
Na sequência da implantação da República, foi
nomeado procurador-geral da República (19 de Outubro de 1910) e reitor da
Universidade de Coimbra (31 de Outubro de 1910).
Percurso político
(Foto - O Presidente da República Manuel de
Arriaga em visita à Escola-Oficina n.º 1 da Graça. A Escola foi criada em 1905,
com princípios pedagógicos modernos, assentes na aprendizagem teórica e prática,
no estímulo e na capacitação do aluno, em detrimento do ensino tradicional,
livresco e punitivo. Foi dirigida por republicanos, anarquistas e maçons.
1911-12-24)
Membro da geração de 70, Manuel de Arriaga
aderiu aos ideais republicanos e interveio, desde muito cedo, na vida política
e cultural do país. Em Maio de 1871 foi um dos 12 signatários do programa das
Conferências Democráticas do Casino, ao lado de intelectuais como Antero de
Quental, Adolfo Coelho, Teófilo Braga, Eça de Queirós, José Fontana, Oliveira
Martins, Guilherme de Azevedo ou Jaime Batalha Reis. A iniciativa visava
preparar a opinião pública para o debate de temas filosóficos, sociais e
científicos, então em voga na Europa e, simultaneamente, planear um novo rumo
para os destinos de Portugal. Iniciadas a 22 de Maio de 1871, as conferências
foram interrompidas por ordem das autoridades monárquicas a 22 de Junho
seguinte, com o argumento de que sustentavam "doutrinas e proposições que
atacavam a religião e as instituições políticas do Estado".
Manuel de Arriaga foi um membro destacado da
facção republicana federalista, tendo sido um dos responsáveis pela criação do
Centro Republicano Federal de Lisboa, em Janeiro de 1880. Surgido das
divergências no seio do Centro Republicano Democrático de Lisboa, procurou
imprimir ao movimento republicano um carácter mais popular e assumidamente
antimonárquico. Em Maio do mesmo ano foi eleito presidente da mesa da
Assembleia Geral do Centro Republicano.
(Foto - O Presidente da República Manuel de
Arriaga, acompanhado pelos netos, nos jardins do palácio do Manteigueiro, onde
passou a residir, após a sua nomeação. Esteve nesta casa pouco tempo, pois em
1912 foi autorizado a mudar-se para o Palácio de Belém. 1912-04)
Participou activamente nas comemorações do
Tricentenário de Camões, presidindo ao banquete em honra da Câmara Municipal de
Lisboa e da Comissão Executiva de Imprensa para as festas do Centenário, em
Julho de 1880. Na sequência dessa participação, demitiu-se do Centro
Republicano Federal onde foi criticado por ter participado em brindes à
Monarquia. Em 1881 discursou em comícios de protesto contra o Tratado de
Lourenço Marques.
Em Junho de 1882, apresentou o Projecto de
Organização Definitiva do Partido Republicano Português, documento que
representou a primeira sistematização do ideário republicano.
Em 1883 foi eleito deputado republicano pelo
círculo do Funchal e em 1890 pelo de Lisboa. Em 1885 foi vereador da Câmara
Municipal de Lisboa. Nessa qualidade, desenvolveu uma intensa actividade
oratória nos comícios de propaganda republicana. Em Janeiro de 1890, na
sequência das manifestações contra o Ultimato britânico de 11 de Janeiro de
1890, Manuel de Arriaga foi preso por falar à população, em Lisboa, numa altura
em que os comícios estavam proibidos.
Em Janeiro de 1891, no congresso do PRP, foi
eleito membro do Directório do PRP. Manuel de Arriaga e os restantes elementos
do Directório não aprovaram a revolta republicana de 31 de Janeiro de 1891, no
Porto, por considerarem não estarem reunidas as condições necessárias para o
seu sucesso.
Em 1896 integrou o Grupo Republicano de
Estudos Sociais, iniciativa que visava constituir uma espécie de consciência
moral e crítica do movimento republicano.
Em 1898, Manuel de Arriaga pediu a demissão
do Directório do Partido Republicano, continuando, porém, uma intensa atividade
de intervenção cívica, participando em comícios e conferências.
No seguimento da implantação da República,
foi empossado reitor da Universidade de Coimbra, a 19 de Outubro e
Procurador-Geral da República a 16 de Novembro de 1910.
Assembleia Nacional Constituinte e eleição
para Presidente da República
Em Junho de 1911 foi eleito deputado à
Assembleia Nacional Constituinte, pelo círculo do Funchal, presidindo às
Comissões de Redacção e dos Negócios Estrangeiros.
A eleição do primeiro Presidente da República
foi pautada por uma forte competição, tendo-se equacionado os nomes de Anselmo
Braamcamp Freire, Correia Barreto, Basílio Teles, José Relvas, Manuel de
Arriaga, Bernardino Machado, Duarte Leite, Sebastião de Magalhães Lima e Alves
da Veiga.
Manuel de Arriaga e Bernardino Machado, os
dois principais candidatos, apresentavam apoios e programas políticos
alternativos. Arriaga, proposto pelos partidários de António José de Almeida,
chefe da tendência evolucionista, e de Brito Camacho, defendia os temas caros
aos moderados: conciliação nacional, respeito pela legalidade, ordem pública e
revisão da Lei da Separação. Bernardino Machado, proposto pela tendência que
iria dar origem ao Partido Democrático de Afonso Costa, advogava a unidade do
PRP, a manutenção do núcleo duro da legislação do governo provisório
(designadamente a Lei da Separação) e o prosseguimento do combate aos inimigos
do regime.
A 24 de Agosto de 1911 Manuel de Arriaga foi
eleito primeiro Presidente constitucional da República Portuguesa. Recolheu 121
votos, contra 86 de Bernardino Machado, 4 de Duarte Leite, 1 de Sebastião de
Magalhães Lima, 1 de Alves da Veiga e 4 listas em branco.
Depois da Presidência
Após abandonar a Presidência dedicou-se à
redacção das suas memórias. Publica, em 1916, o seu último livro intitulado Na
Primeira Presidência da República Portuguesa. Um Rápido Relatório, onde
justificou a sua conduta política durante o período em que foi chefe do Estado.
Morreu em Lisboa a 5 de Março de 1917 com 76
anos de idade. Por indicação do governo de António José de Almeida, o seu
funeral teve honras de Estado, ficando sepultado no Cemitério dos Prazeres. A
16 de Setembro de 2004, por decisão da Assembleia da República, Manuel de
Arriaga foi trasladado para o Panteão Nacional, com honras de chefe de Estado.
(Foto - Funeral de Manuel de Arriaga. Os alunos da Escola de Guerra asseguram a guarda de honra ao féretro do antigo Presidente, junto à sua casa, na rua de São Francisco de Paula, atual rua Presidente Arriaga. 1917Mandato Presidencial
24 de agosto de 1911 - 29 de maio de 1915
A Presidência de Manuel de Arriaga pautou-se
por dificuldades várias, decorrentes, sobretudo, das rivalidades e lutas que
desde cedo começaram a minar a unidade da família republicana.
(Foto - O Presidente da República Manuel de Arriaga, saindo do Palácio de São Bento, após a cerimónia da sua tomada de posse. 1911-08-24)
A primeira tarefa do recém-empossado chefe de
Estado foi a de formar o 1.º Governo Constitucional. A intenção era constituir
um ministério de unidade da família republicana, à beira de profundas cisões.
Inicialmente escolheu Duarte Leite - personalidade não conotada com qualquer
das correntes republicanas -, que não conseguiu formar governo, dada a recusa
dos principais líderes republicanos. Manuel de Arriaga recorreu então a João
Chagas, cujo ministério tomou posse a 4 de Setembro de 1911. O executivo era
composto exclusivamente por personalidades próximas do "bloco" que
elegera Arriaga e manteve-se em funções até 12 de Novembro de 1911.
(Foto de Manuel de Arriaga, recém-eleito
Presidente da República, saindo do Palácio de São Bento, a caminho do Palácio
de Belém, para uma receção aos membros do Governo e deputados. 1911-08-24)
Perante as divisões que se acentuaram na
Câmara dos Deputados (democráticos ou radicais, unionistas, evolucionistas e
independentes), as dificuldades do I Governo eram evidentes. À divisão efectiva
das forças republicanas juntou-se, a 29 de Setembro de 1911, uma tentativa de
insurreição militar no Porto e, entre 1 e 5 de Outubro, a primeira incursão
monárquica, realizada por uma coluna de Paiva Couceiro a partir da Galiza.
Um dos principais problemas do novo
ministério reside na escolha do general Joaquim Pimenta de Castro para titular
da pasta da Guerra, grande inimigo dos apoiantes de Afonso Costa no Exército.
Em causa estavam as estratégias de moderação ou de radicalização da actuação
republicana, particularmente face aos liberais monárquicos. O general fora
demitido no dia 8 de Outubro, na sequência da primeira incursão monárquica de
Paiva Couceiro.
A 20 de Outubro de 1911 dá-se a primeira
cisão no PRP, com a desvinculação de António José de Almeida. Paralelamente,
depois do Congresso do Partido Republicano, que decorre entre 27 e 30 de
Outubro, consagra-se a hegemonia dos "democráticos" de Afonso Costa.
Após o Congresso do PRP, essa facção passou a designar-se Partido Democrático.
A divisão republicana é irremediável e a João
Chagas não restava senão demitir-se. Fê-lo a 7 de Novembro de 1911, por entender
que o seu governo já não representava a maioria dos republicanos.
Manuel de Arriaga chamou António José de
Almeida a formar governo. Perante a recusa deste, recorreu ao ex-ministro dos
Negócios Estrangeiros de João Chagas, o médico Augusto de Vasconcelos. O seu
executivo entrou em funções a 12 de Novembro de 1911, representando mais uma
tentativa de constituir um "governo de coligação". Manteve-se em
funções até 16 de Junho de 1912. O novo governo procurarava constituir-se em
torno da União Nacional Republicana (UNR), tentativa de transformar o
"bloco" que elegera Arriaga no partido de centro-direita que fosse
uma alternativa aos democráticos de Afonso Costa. No entanto, a UNR teve uma
existência efémera.
Em Fevereiro de 1912, António José de Almeida
fundou o Partido Evolucionista e dois dias depois Brito Camacho anuncia a
criação da União Republicana.
Depois do pedido de exoneração de Augusto de
Vasconcelos, Manuel de Arriaga insistiu em nova solução de ministério de
"concentração". Após várias diligências, entrou em funções a 16 de
Junho o governo presidido por Duarte Leite. Dele fizeram parte três
democráticos, dois evolucionistas e um independente próximo da UNR. Manteve-se
em funções até 9 de Janeiro de 1913.
Duarte Leite demitiu-se a 6 de Janeiro de
1913 e Manuel de Arriaga tentou chamar Basílio Teles e depois António José de
Almeida, que, no entanto, recusaram. Apoiado pelos unionistas e independentes,
foi empossado a 9 de Janeiro o primeiro governo homogéneo da República
presidido por Afonso Costa. Manteve-se em funções até 9 de Fevereiro de 1914. O
executivo elegeu o equilíbrio orçamental como a principal prioridade. Através
de uma política de contenção orçamental (com a chamada "lei-travão"
de 15 de Março de 1913 e a Lei dos adidos de 14 de Junho do mesmo ano) e do
aumento das receitas (por intermédio da reforma da contribuição industrial e
predial e do imposto de transmissão), conseguiu saldos positivos nos orçamentos
de 1912-1913 e 1913-1914. Foi a primeira vitória do ministério democrático.
Apesar da gestão de Afonso Costa continuar a
caracterizar-se pela sua política de "racha-sindicalistas", o número
de greves decaiu (35 em 1912, 19 em 1913 e 10 em 1914). Quanto à agitação
monárquica, ela estava longe de se considerar concluída.
Uma tentativa revolucionária ocorreu a 20 de
Julho de 1913, quando elementos afectos à monarquia tentam assaltar vários
quartéis de Lisboa. A de maior relevo ocorreu a 21 de Outubro de 1913 dirigida
por João de Azevedo Coutinho. Embora prevista também para o Porto, acabou por
se restringir à capital com a destruição das redacções dos jornais O Dia e A
Nação e alguns estragos no Museu da Revolução. As hostes republicanas
minoritárias também conspiravam contra o Partido Democrático.
A 27 de Abril de 1913 o governo sofreu a
primeira contestação civil e militar com origem numa das componentes da
revolução do 5 de Outubro. Inspirada por Machado dos Santos, intentona
consistiu na organização de manifestações de civis junto do Ministério do
Interior e de alguns aquartelamentos de Lisboa e na saída de uma coluna de
Infantaria 5, que acabaria por ser detida. Até ao final do mês registaram-se
ainda outros movimentos insurreccionais e atentados bombistas.
As pressões sobre o governo dos democráticos
aumentaram, o que levou o Presidente Manuel de Arriaga a tomar a iniciativa de
auscultar os chefes dos três partidos sobre a possibilidade de constituição de
governos extrapartidários. Na sequência dessa iniciativa, Afonso Costa
solicitou a exoneração a 26 de Janeiro de 1914. A 9 de Fevereiro Arriaga chamou
Bernardino Machado para liderar o novo governo.
O executivo de Bernardino Machado pretendia
ser um governo de reconciliação nacional, integrando três democráticos. Propôs
uma trégua aos monárquicos, aos sindicalistas e aos "intransigentes"
do 27 de Abril, a quem prometeu uma amnistia. Aos católicos propôs uma revisão
da Lei da Separação. Manteve-se em exercício até 23 de Junho de 1914. A 22 de
Junho de 1914, por entender que a normalização da vida política da República
seria facilitada com a saída dos ministros democráticos, Bernardino Machado
pediu a demissão colectiva do gabinete. A 23 de Junho obteve de Manuel de
Arriaga autorização para um governo "extrapartidário". Todos os
ministros passaram a independentes, à excepção do presidente. Manteve-se em
exercício até 12 de Dezembro de 1914.
No dia 7 de Agosto de 1914, o governo de
Bernardino Machado levou ao Congresso, reunido extraordinariamente, uma
declaração de princípios sobre a condução da política externa portuguesa
perante o deflagrar da I Guerra Mundial que foi votada por unanimidade. Ainda que
vagamente, afirmava-se que Portugal não faltaria aos seus compromissos
internacionais, com particular atenção no que dizia respeito à aliança com
Inglaterra.
Na sequência do primeiro ataque alemão às
colónias portuguesas (25 de Agosto) partiram de Lisboa a 11 de Setembro de 1914
as forças expedicionárias com destino a Angola sob o comando do general Alves
Roçadas, e a Moçambique comandadas pelo coronel Massano de Amorim.
Se por um lado o interesse em acautelar as
possessões ultramarinas foi unanimemente defendido por todas as sensibilidades
políticas nacionais, por outro, as vias para alcançar tal objectivo originam
divisões entre evolucionistas, unionistas e democráticos.
António José de Almeida colocou a tónica no
acompanhamento estrito da política inglesa. Os partidários de Brito Camacho
inclinaram-se para a abstenção portuguesa em relação à guerra na Europa,
defendendo o reforço militar defensivo das colónias. Os democráticos, ao
contrário, defendiam uma posição intervencionista de Portugal no confronto com
os Impérios centrais, vendo nisso uma oportunidade de afirmação da autonomia do
país submetido ao estatuto menor de "protectorado inglês". Mas, mesmo
entre estes, as diferentes interpretações das cláusulas da aliança anglo-lusa
traduziam-se em posicionamentos distintos quanto à intervenção portuguesa no
conflito.
A situação interna e externa do país acabaria
por viabilizar as soluções "guerristas" e a entrada de Portugal na I
Guerra Mundial.
Por entender ser oportuno constituir um
governo de unidade republicana sob a sua égide, o Partido Democrático
precipitou a queda do governo de Bernardino Machado.
O Presidente Manuel de Arriaga desenvolveu
uma série de diligências tendo em vista a constituição de novo governo
extrapartidário mas sem sucesso, vendo-se obrigado a chamar os democráticos.
Afonso Costa "entregou" a Vítor
Hugo de Azevedo Coutinho a liderança do executivo a formar. O ministério de
Azevedo Coutinho entrou em funções a 12 de Dezembro de 1914, mas a sua
legitimidade tinha nascido "ferida de morte", dada a rejeição do seu
nome por parte do Senado. O governo de Azevedo Coutinho fica conhecido como
"Os Miseráveis", um trocadilho com o nome do seu presidente, Vítor
Hugo.
Entre 20 e 22 de Janeiro de 1915 ocorreu um
protesto de oficiais do Exército, que ficou conhecido como "Movimento das
Espadas". Na sua base terá estado a transferência do major Craveiro Lopes,
alegadamente por motivos políticos. Alguns oficiais, entre os quais Pimenta de
Castro e Machado Santos, apresentaram protestos. O governo procedeu a prisões e
as contestações subiram de tom. O ministro da Guerra demitiu-se.
Manuel de Arriaga, alarmado com a virulência
da luta política e utilizando como pretexto os acontecimentos de 20 de Janeiro,
interveio, provocando a demissão do governo (24 de Janeiro) e encarregando o
general Pimenta de Castro de organizar um ministério com o objectivo de
pacificar o país e preparar as próximas eleições legislativas, adiadas sine die
desde Setembro de 1914 por imperativos da ordem internacional.
O governo de Pimenta de Castro marcou o
início da tendência que haveria de ser típica dos últimos anos da República: um
poder crescente dos militares na governação do país. Pimenta de Castro entregou
sete das nove pastas a militares. A 4 de Março de 1915 as forças da GNR e da
Polícia impediram o Parlamento de se reunir e o governo entrou formalmente em
ditadura.
Pimenta de Castro levou para o poder a facção
mais conservadora e tradicionalista da hierarquia militar profissional. A
política de guerra foi praticamente esquecida, as perseguições contra os
monárquicos foram interrompidas, as relações entre a República e a Igreja
Católica pacificadas e as eleições marcadas para 6 de Junho.
A reunião do Congresso acabaria por
realizar-se no Palácio da Mitra, no concelho de Loures, com a presença de 90
congressistas, ocasião em que foram proferidos fortes ataques ao executivo e ao
Presidente da República. Por proposta inicial de Afonso Costa, foi aprovada por
unanimidade uma moção que considerava inconstitucional a nomeação de Pimenta de
Castro por parte do chefe de Estado, bem como a publicação pelo Ministério, e
com a assinatura do Presidente da República, de diplomas com matérias
exclusivas do Parlamento. Considerou-se, ainda, que o governo, com o
assentimento do Presidente da República, atentara contra o livre exercício do
poder legislativo, mediante o encerramento do edifício do Congresso.
A 14 de Maio eclodiu uma revolução armada em
Lisboa com o objectivo de "restituir a República aos republicanos".
Participaram a Marinha, parte do Exército e grande número de civis, enquadrados
pela Maçonaria e pela “Formiga Branca”.
A Junta Revolucionária, que superiormente
preparou e dirigiu o movimento de 14 de Maio, era constituída pelos majores
Norton de Matos e Sá Cardoso, pelo capitão Álvaro de Castro, pelo
capitão-tenente Freitas Ribeiro e pelo engenheiro civil António Maria da Silva,
todos eles membros da Maçonaria, à excepção do terceiro. Nos bastidores Afonso
Costa desempenhou um papel de relevo. Os sectores da Armada foram chefiados por
Leote do Rego. Nesse mesmo dia, Machado Santos foi preso e o seu órgão de
imprensa, O Intransigente, extinto. Registaram-se em Lisboa assaltos a armazéns
e padarias em busca de comida.
A revolta conduziu à derrocada do governo de
Pimenta de Castro e permitiu reinstalar os democráticos no poder. A República
foi de novo proclamada das janelas da Câmara Municipal de Lisboa. A Junta
Revolucionária indigitou o primeiro governo pós-revolução (no dia 15) dirigido
por João Chagas. Mas este, gravemente ferido em consequência de um atentado (no
dia 16) a caminho de Lisboa, não chegou a tomar posse. O ministério foi
remodelado (no dia 17) e José Ribeiro de Castro, vice-grão-mestre da Maçonaria,
assumiu interinamente a presidência de um ministério que tem como missão
principal proceder a eleições. Com excepção de um unionista e de um
evolucionista desvinculado do Partido, este executivo é maioritariamente
democrático.
Na sequência da vitória
"constitucionalista", Manuel Arriaga renunciou ao mandato
presidencial, em carta ao presidente do Ministério de 16 de Maio. Dez dias
volvidos enviou a mensagem de resignação ao Congresso, onde renunciou
formalmente no dia 29 de Maio. Nesse mesmo dia abandonou o Palácio de Belém
escoltado por forças da GNR.
Visitas de Estado
Com a proclamação da República em 1910, o
poder passaria para as mãos de um governo provisório até à aprovação da
Constituição em 1911, que instituía poderes bastante reduzidos ao Presidente da
República. Para contrastar com o poder do Rei, a sua projecção pública e os
seus meios materiais seriam limitados ao mínimo e não estava sequer prevista residência
oficial, apenas um gabinete no Palácio de São Bento, desviando o centro do
poder para o Parlamento.
Embora a Constituição de 1911 lhe atribuísse
funções de representação da Nação na política externa da República, a limitação
dos poderes presidenciais nesta fase de afirmação do novo regime republicano
impedia que o Presidente da República tomasse decisões reais quanto ao futuro
das relações diplomáticas com outros países.
Durante a I República uma profunda crise
económica e social herdada da Monarquia, e uma constante instabilidade
governativa, impediram que Portugal se ocupasse em desenvolver a sua política
externa. Não estavam criadas condições para os Presidentes da República
efectuarem ou receberem visitas de Estado, salvo raras excepções nos mandatos
dos Presidentes Bernardino Machado, João do Canto e Castro e António José de
Almeida.
Em 1914, Columbano Bordalo Pinheiro executou
o seu retrato oficial, o primeiro da Galeria dos Retratos, ainda que não seja o
mais antigo. Logo em 1910, após a instauração da República, Columbano havia
integrado uma comissão de inventariação dos bens dos palácios reais. Em 1911,
tinha feito parte da comissão - de cinco personalidades – nomeada para apreciar
os projetos para a Bandeira Nacional. O Governo encomendou-lhe diversos outros
retratos de primeiras figuras do republicanismo.
No retrato, reconhece-se a atual sala dos
Embaixadores do Palácio de Belém, através da figura escultórica de fundo, e que
faz parte do fogão de sala ainda hoje aí existente. A Cadeira dos Leões foi
usada pela primeira vez, na República, por Manuel de Arriaga, que se fez
retratar nela. Desde então a Cadeira permanece associada à figura do chefe do
Estado.
Fonte: https://www.museu.presidencia.pt/
Fotos: https://www.museu.presidencia.pt/