É mais provável do que se pensava. Muitos
explodem na atmosfera e outros caem no mar. A ameaça hoje chama-se Apophis e
pode embater na Terra em 2036.
“ De repente o céu dividiu-se em dois e o fogo
apareceu sobre a floresta. Todo o lado norte ficou coberto de fogo. Nesse
momento fiquei tão quente que não o consegui suportar, como se a minha camisola
estivesse a arder. Queria tirá-la, mas de repente o céu fechou-se, houve um
grande trovão e fui projectado alguns metros. Depois disso ouvi um barulho como
se rochas estivessem a cair ou canhões a disparar e a terra tremeu. Quando o
céu abriu, um vento quente corria entre as casas. Mais tarde vimos que muitas
janelas estavam partidas.”
O relato é de S. Semenov, um russo que há
exactamente um século vivia em Vanavara, na zona central da Sibéria. O homem
provavelmente morreu sem saber o que viu ás 7h17 daquela manhã de 30 de Junho
de 1908, quando se preparava para tomar o pequeno-almoço. Não foi o único a
partir na ignorância. Foram precisos muitos anos para se saber exactamente o
que em poucos minutos destruiu 2150 km2 de floresta (mais de 80 milhões de
árvores); provocou um movimento sísmico equivalente a um terramoto de grau 5 na
escala de Richter; fez os barómetros em Inglaterra registar uma onda de choque
atmosférica que deu volta ao globo; causou a formação de nuvens a grande
altitude que reflectiam a luz solar e permitiam ler os títulos dos jornais à
meia-noite em alguns locais da Europa e da Ásia; e provocou uma explosão de
cerca de 15 megatoneladas de TNT (mil vezes a potência de Little Boy, a bomba
largada em Hiroxima, em 1945).
As duvidas sobre o que aconteceu permaneceram
durante anos. A revolução bolchevique, a Primeira Guerra Mundial e o isolamento
da região adiaram as expedições ao local, que só foi visitado em 1921 pelo
cientista russo Leonid Kulik. Desde logo concluiu que o desastre de Tunguska
(assim baptizado por ter ocorrido sobre o rio com o mesmo nome) tinha sido
provocado por um meteorito. Mias tarde Kulik conseguiu convencer o governo a
financiar nova expedição, que chegou em 1927. Para sua surpresa não encontrou
nenhuma cratera que indicasse o ponto de impacto.
As árvores destruídas
continuavam a marcar a rota do meteoro e na zona de explosão ainda havia algumas
de pé, com pequenos ramos. A ausência de uma cratera motivou, durante décadas,
diversos rumores sobre o sucedido, inclusive a queda de um OVNI – Tunguska
tornou-se um local de culto para aqueles que procuram vida extraterrestre e o
desastre foi várias vezes mencionado na série Ficheiros Secretos como um dos
grandes mistérios da humanidade.
Hoje, a opinião unânime entre os cientistas é
que o meteorito ou asteróide, depois de entrar na atmosfera, acabou por não
resistir à pressão e explodiu a cerca de oito quilómetros de altitude. Até há
alguns anos, julgava-se que pra provocar uma destruição semelhante, o corpo
celeste teria de ter entre 50 e 80 metros de diâmetro. No entanto, um estudo
recente do Sandia National Liboratory, no Novo México, publicado no
Internacional Journal of Impact Engineering, indica que o asteróide poderia ter
apenas 30 a 50 metros. Através de uma simulação num supercomputador, a equipa
liderada pelo cientista Mark Boslough concluiu que o meteoro entrou na
atmosfera a 15km por segundo, num ângulo de 35º sobre o horizonte. A onda de
choque terá embatido no solo a 180km por hora e provocado vários equivalentes a
um furacão de categoria 3.
Além de detalhar o que sucedeu há 100 anos na
Sibéria, o trabalho de Boslough permite outra conclusão: os meteoritos mais
pequenos também são perigosos. “ Os pequenos asteróides são muito mais do que
os grandes e explodem antes de chegar ao solo. Só os que têm mais de 100 metros
é que fazem crateras”, explica o cientista.
Devido ao movimento de rotação da terra, se o
asteróide de Tunguska tivesse caído quatro horas mais tarde, a cidade imperial
de S. Petersburgo teria sido arrasada. Já no que toca Lisboa, Mark Boslough não
tem dúvidas: “ Um asteróide muito pequeno, com 40 metros de diâmetro, podia destrui-la.”
Ainda assim, o cientista diz que é mais provável a capital portuguesa ser
atingida por um terramoto do que por um meteoro. “ A maioria explode demasiado
alto na atmosfera para ser uma ameaça. A probabilidade de alguém ser morto por
um asteróide é de uma num milhão”, diz.
No entanto, as hipóteses têm vindo a aumentar
com a descoberta de novos corpos celestes. Tem sido assim ao longo das últimas
décadas. Em 1980 havia apenas 86 asteróides conhecidos a uma distância próxima
da Terra. Dez anos mais tarde o número tinha subido para 170. No ínicio do ano
2000 eram 921. Hoje, de acordo com os números da NASA, são para cima de 5576 e
novos corpos são descobertos todos os meses.
Mais importante: na viragem do milénio eram
conhecidos 300 objectos que ultrapassavam um quilómetro de diâmetro.
Actualmente, esse registo já vai nos 747. A preocupação poderá aumentar com as
observações dos cientistas a estenderem-se para lá daquela que é conhecida como
a Cintura dos Asteróides, entre Marte e Júpiter. Em 1992, os astrónomos da
Universidade do Havai e do Massachusetts Institute of Technology, David Jewitt
e Jane Luu, localizaram uma gigantesca região de asteróides que começa em
Neptuno. Baptizada de cintura de Kuiper, contém pelo menos mil objectos
suficientemente grandes para serem vistos da Terra. Ou seja, têm mais de 100 km
de diâmetro. São os chamados “assassinos de planetas”.
A probabilidade de um meteorito destruir uma
cidade também é baixa devido à composição da Terra. Com 70% do planeta coberto
de água, é mais comum um objecto vindo
do espaço cair nos oceanos do que num dos cinco continentes. Assim se explica a
existência de poucas crateras provocadas por meteoritos e foi essa lógica que
levou a geofísica Dallas Abbott, da Universidade de Columbia, a passar a última
década no fundo do mar à procura de crateras que não tivessem sido provocadas
por vulcões. “Esperava encontrar entre 10 e 100 crateras com menos de 180
milhões de anos e talvez uma com menos de 1 milhão de anos com 20 km de
diâmetro ou mais largas”. Foi por isso que ficou “surpreendida” por ter
encontrado 14 marcas de quedas de jovens asteróides de grandes dimensões, num
período curto em termos geológicos.
Uma das descobertas “mais excitantes” para a
cientista foi a da cratera no golfo de Carpentária, a norte da Austrália. Abbot
acredita que um objecto com 300 metros de diâmetro atingiu o golfo no ano 536.
Um objecto desse tamanho podia libertar tanta energia como mil bombas
nucleares. “ Esperamos relacionar as nossas descobertas a factos da História da
humanidade, mas ainda estamos a trabalhar nisso”, diz. Alguns relactos da
época, incluindo do historiador bizantino Procópio, dão contas de céus
nublados, fracas colheitas e Verões frios entre 536 e 537. Mas, como o
asteróide caiu no mar, os efeitos passaram rapidamente.
Muito mais preocupante foi o que Abbot descobriu
ao largo da costa de Madagáscar, no Oceano Índico. No fundo do mar, a cientista
encontrou indícios da queda de um objecto espacial com três a cinco quilómetros
de diâmetro há cerca de 4800 anos. O seu impacto terá provocado um tsunami com
180 metros de atura (várias vezes superior ao de 2004) que atingiu o Oceano
Pacífico. Se tivesse caído em terra, o seu impacto teria levantado uma
gigantesca nuvem de pó e grande parte do continente africano teria entrado numa
idade do gelo.
Alguns cientistas afirmam que ocorreu um
processo semelhante a esse na América do Norte há 13 mil anos e que levou à
extinção dos mamutes, tigres-dentes-de-sabre e outros animais selvagens. Em
2005, uma equipa liderada por Richard Firestone, do Laboratório Nacional
Lawrence Berkeley, na Califórnia, chegou à conclusão de que “um cometa de 10km,
que talvez se tenha composto a partir dos restos de uma explosão de uma
supernova, pode ter atingido a América do Norte há 13 mil anos”. Para defender
esta tese, a equipa de Firestone realizou análises do solo por toda a América
do Norte e, na maioria delas, encontrou irídio, um elemento raro na Terra mas
comum no espaço. A explosão deste corpo celeste sobre o Canadá (não existe cratera)
terá alterado o clima de uma forma tão radical que começou ai um período de
arrefecimento global.
Neste momento, a NASA tem sob observação 210
corpos celestes com possibilidade de embater na Terra num futuro próximo
(http://neo.jpl.nasa.gov/risk/) , apesar de essa probabilidade ser reduzida.
Aquele que mais tem chamado a atenção dos cientistas é o 99942 Apophis,
descoberto a 19 de Junho de 2004, que tem uma hipótese em 45 mil de colidir com
a Terra em 2036. Com apenas 300 metros, o seu impacto teria uma força
semelhante à de 60 mil bombas de Hiroxima.
Os astrónomos têm-se preocupado em estabelecer
as rotas precisas dos asteróides para conseguir prever algum possível impacto.
“Na última década descobrimos a órbita
da grande maioria de asteróides conhecidos e sabemos que não vão atingir a
Terra (ou pelo menos é improvável que tal aconteça)”, explica Mark Boslough. “
Deviriamos enviar um emissor para o Apophis rapidamente para garantirmos que a
Terra não estará na sua rota. Quanto mais depressa for feito, mais tempo
teríamos para descobrir o que fazer se houver uma trajectória de impacto.”
Quem esta de acordo com Boslough é Rusty
Schweickart, antigo astronauta e actual director da Fundação B612. Criada a 7
de Outubro de 2002, esta instituição (baptizada com o nome de asteróide de O
Principezinho, de Antoine Saint-Exupéry) tem por objectivo conseguir “alterar
significativamente a órbita de um asteróide de uma forma controlada até 2025.”
Nesse sentido, a fundação elaborou uma simulação por computador com um corredor de risco definido, onde o
Apophis poderia embater. Dessa rota fazem parte a Rússia, Califórnia, México,
Nicarágua, Costa Rica, Colômbia e Venezuela. Depois cairia no Atlântico. Além
dos milhões de mortos, a queda do Apophis provavelmente daria origem a um
violento tsunami.
Para já há
poucas formas de interceptar um objecto espacial. Com algum tempo de
aviso, Mark Boslough diz que seria possível recorrer a tractores gravitacionais
– algo que atraísse os asteróides para longe da gravidade terrestre.
No imediato, teria de se recorrer a uma
“intercepção nuclear”. No entanto, o processo não é tão simples como parece em
filmes como Armageddon, no qual uma equipa de astronautas vai colocar uma bomba
nuclear no objecto espacial. A par da impossibilidade de o fazer, um tratado
internacional em vigor desde 1963 proíbe o uso de armas nucleares no espaço.
Segundo o cientista, esta seria a parte de mais fácil resolução do problema:
”Acredito que haveria um acordo se a alternativa fosse a aniquilação do
planeta.”
http://neo.jpl.nasa.gov/stars/
Quedas assinaladas por descobertas recentes
A maioria dos meteoritos não chega a embater no
solo. Muitos explodem no ar. Os que atingem o planeta têm grandes hipóteses de
cair no Oceano.
- Tunguska – A ausência de uma cratera intrigou
os cientistas durante anos. Hoje acredita-se que o meteoro explodiu a cerca de
oito quilómetros de altitude, no centro da Sibéria, em 1908. Destruiu 2150km2.
- Golfo de Carpentária – A cratera de um
meteorito com 300 metros foi localizado a norte da Austrália por Dallas Abbott.
Terá caído no ano 536. Relatos da época dão conta de céus nublados, fracas
colheitas e Verões frios.
- Madagáscar - Ao largo deste país africano,
Dallas Ababott encontrou indícios da queda de um objecto espacial com três a cinco
quilómetros há cerca de 4800 anos. Terá provocado um tsunami com 180 metros de
altura.
- América do Norte – Em 2005, uma equipa
liderada por Richard Firestone apresentou provas da queda de um meteorito no
Canadá há 13 mil anos que matou animais como mamutes e tigres-dente-de-sabre e
originou uma idade do gelo.
Fonte: Revista Sábado
Texto: Nuno Tiago Pinto
Fotos da Net
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