quinta-feira, 2 de junho de 2016

Da Ignorância

Sabemos que não sabemos e por isso esforçamo-nos por clarificar aspectos que possam ter a ver com o que aí vem. Ou então angustiamo-nos. Porque o reino dos céus é só dos que da ignorância sabem nada.


1 – Sabemos que não sabemos.
Não sabemos muito mais do que o que sabemos sobre assunto algum, e o tamanho da nossa ignorância agiganta-se de forma directamente proporcional à quantidade de conhecimento que conseguimos assimilar e elaborar. Quanto mais sabemos, melhor percebemos o pouco que isso é e, sem querer, vamos chegando a um qualquer entendimento dos dizeres socráticos. Vamos dando conta das perguntas que somos capaz de formular, sem vislumbre de respostas. Vamos percebendo como crenças arreigadas ocupam o lugar de informação que não temos. Vamos entendendo como as nossas muitas duvidas nos facilitam a aceitação de verdades mal esgalhadas. Vamos, dia a dia, situando-nos como podemos, face às nossas incertezas e à volubilidade do conhecimento que julgamos deter.

2 – Sabemos que não temos a menor ideia de como será o que há-de vir.
Percebemos de forma indistinta que o que guardamos como memória do passado, o nosso e o do mundo, é parcial, rebuscado, opinioso e , eventualmente, mesmo falacioso.
Sabemos que aquilo que vamos assumindo como certo, como bom ou como útil, dura o que dura, o que é sempre demasiado, pouco para acalmar frustrações ou para permitir sonhos de certezas.
Vivemos, actuamos e procedemos cheios de uma atitude de segurança que só pode vir, em função do que sabemos sobre o que não sabemos, da nossa intrínseca capacidade de lidar com o desconhecido.

3 – Porque sabemos que não sabemos, alguns de nós, migalha a migalha, grão a grão, esforçam-se por aclarar aspectos novos, diferentes ou negligenciados, de uma qualquer realidade, tão parcelar e obscura como todas as realidades.
Outros, angustiam-se terrivelmente pela consciência de desamparo que tamanha ignorância pode querer significar e, ou invocam deuses novos e velhos em vão e a propósito de questões triviais, ou deprimem-se e azedam num funeral precoce de toda a capacidade de esperança.
Entre uns e outros, restam todos os outros, que de conhecimento têm pouco e da ignorância sabem nada. Parece que é deles um reino mítico dos céus.

Fonte: Revista Notícias Magazine
Texto: Isabel Leal (Psicologa)
Foto da Revista
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