Os segredos da Natureza
Como falam os insectos? (1945)
A vida dos insectos, que tem
merecido a atenção de numerosos homens de ciência e até de iminentes
escritores, é conhecida em grande parte e hoje, pode dizer-se, há tendência de
para se aceitar que os insectos, assim como os outros animais, comunicam entre
si. Todo aquêle que dedicou alguns momentos à observação da vida das formigas
assim pensará.
Qual será, então, o meio de
comunicação que utilizam os insectos?
Nada se passa que os nossos
sentidos possam perceber e, no entanto, as comunicações parecem transmitir-se
de insecto para insecto.
Wolfers e outros cientistas,
estudando um certo número de insectos, pensam que estes podem comunicar entre
si e até reconhecer a topografia de um lugar, utilizando as vibrações
ultra-sonoras. Sendo assim, êstes animais terão geradores e receptores de
ultra-sons.
Supõe Wolfers que um insecto
poderá adquirir a noção da configuração de um lugar utilizando o mesmo método que
hoje se emprega para o estudo do relêvo submarino. O navio onde se faz o estudo
possue um gerador que emite um feixe discontínuo de ultra-sons, que se reflecte
no fundo do mar e é recebido pelo receptor também instalado a bordo. O
intervalo de tempo que medeia entre a emissão e a recepção, assim como as
particularidades da onde recebida fixam a profundidade e a natureza do terreno.
Do mesmo modo que os insectos,
para Wolfers, os peixes terão também a possibilidade de emitir e receber ondas
ultra-sonoras.
Mas que são os ultra-sons?
Vejamos algumas noções elementares que nos permitam sabê-lo, compreendendo ao
mesmo tempo o mecanismo de que se servem os insectos para as suas comunicações.
O som é produzido por um
movimento periódico. Nêste movimento, o côrpo que produz o som toma a mesma
posição em intervalos de tempo iguais, com a mesma velocidade em grandeza e
direcção. Êste movimento é propagado ao meio material que rodeia o móvel,
geralmente o ar, que por sua vez o leva até ao nosso ouvido. As ondas sonoras
serão pois, pequenos movimentos de vai-vem das partículas, de ar no mesmo
sentido da propagação, os quais originam variações de densidade e por
consequência variações de pressão que se propagam com a onda.
Ao intervalo do tempo em que o
corpo que produz o som toma a mesma posição e a mesma velocidade chama-se
período e ao número de períodos por segundo dá-se o nome de frequência.
Com estas noções já podemos
compreender o que são os ultra-sons. Para que o nosso ouvido perceba um som é
necessário que a frequência dêste esteja
compreendida entre 20 a 20.000 períodos por segundo. Um som será tanto mais
agudo quanto maior fôr a frequência. Os sons com frequência, inferiores a 20
períodos são chamados infra-sons e os de frequência superiores a 20.000 são os
ultra-sons.
Para a produção dos ultra-sons
usam-se diversos aparelhos, o mais perfeito dos quais é o gerador piezoelectronico.
Nos insectos, os ultra-sons serão produzidos pela vibração de certas partes do
côrpo, sujeitas a um movimento muito rápido que os músculos lhe podem imprimir.
O gerador piezoeléctrico, que
foi descoberto ainda há poucos anos, baseia-se no seguinte princípio: se
comprimirmos uma lâmina especial de quartzo, esta polariza-se electricamente, o
mesmo é dizer que aparece sôbre uma face uma carga positiva e sôbre a outra uma
carga igual, mas negativa. Inversamente, se estabelecermos uma diferença de
potencial alternativa entre as faces da lâmina de quartzo, esta entrará em
vibração.
Os ultra-sons têm já bastantes
aplicações. É conhecida a grande importância que estas vibrações têm nas
comunicações submarinas e na localização pelo éco, dos corpos imersos. Também
na indústria, os ultra-sons são empregados: sob a sua acção se preparam
diversos compostos e sistemas coloidais.
Ultimamente, tem-se estudado as
acções biológicas dos ultra-sons. Tal como verificou o célebre físico francês
Langevin, os peixes são paralisados pelas ondas ultra-sons suficientemente
intensas certos ornismos unicelulares, como as paramécias e até mesmo sistemas
celulares podem ser brutalmente destruídos pela acção destas vibrações. Éstes
fenómenos brutais explicam-se pela variação da pressão que actua sôbre as
células. As células são destruídas do mesmo modo que uma bomba de profundidade
destrói um submarino - é a enorme e rápida diferença de pressão que se
estabelece entre o exterior e o interior do casco que leva à destruição do
submersível.
No campo da medicina, tem-se
procurado estudar as acções dos ultra-sons, utilizando-os no tratamento de
neoplasias superficiais e na preparação de vacinas, mas, por enquanto, as
dificuldades técnicas têm impedido tirar conclusões.
Fonte: Revista Ver e Crer nº1
(1945)
Texto: Dr. António Filipe
Foto da Net
Nota: O Texto está escrito na
íntegra à época.
©
Carlos Coelho