quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Como falam os insectos?

Os segredos da Natureza

Como falam os insectos? (1945)



A vida dos insectos, que tem merecido a atenção de numerosos homens de ciência e até de iminentes escritores, é conhecida em grande parte e hoje, pode dizer-se, há tendência de para se aceitar que os insectos, assim como os outros animais, comunicam entre si. Todo aquêle que dedicou alguns momentos à observação da vida das formigas assim pensará.

Qual será, então, o meio de comunicação que utilizam os insectos?

Nada se passa que os nossos sentidos possam perceber e, no entanto, as comunicações parecem transmitir-se de insecto para insecto.

Wolfers e outros cientistas, estudando um certo número de insectos, pensam que estes podem comunicar entre si e até reconhecer a topografia de um lugar, utilizando as vibrações ultra-sonoras. Sendo assim, êstes animais terão geradores e receptores de ultra-sons.

Supõe Wolfers que um insecto poderá adquirir a noção da configuração de um lugar utilizando o mesmo método que hoje se emprega para o estudo do relêvo submarino. O navio onde se faz o estudo possue um gerador que emite um feixe discontínuo de ultra-sons, que se reflecte no fundo do mar e é recebido pelo receptor também instalado a bordo. O intervalo de tempo que medeia entre a emissão e a recepção, assim como as particularidades da onde recebida fixam a profundidade e a natureza do terreno.

Do mesmo modo que os insectos, para Wolfers, os peixes terão também a possibilidade de emitir e receber ondas ultra-sonoras.

Mas que são os ultra-sons? Vejamos algumas noções elementares que nos permitam sabê-lo, compreendendo ao mesmo tempo o mecanismo de que se servem os insectos para as suas comunicações.

O som é produzido por um movimento periódico. Nêste movimento, o côrpo que produz o som toma a mesma posição em intervalos de tempo iguais, com a mesma velocidade em grandeza e direcção. Êste movimento é propagado ao meio material que rodeia o móvel, geralmente o ar, que por sua vez o leva até ao nosso ouvido. As ondas sonoras serão pois, pequenos movimentos de vai-vem das partículas, de ar no mesmo sentido da propagação, os quais originam variações de densidade e por consequência variações de pressão que se propagam com a onda.

Ao intervalo do tempo em que o corpo que produz o som toma a mesma posição e a mesma velocidade chama-se período e ao número de períodos por segundo dá-se  o nome de frequência.
Com estas noções já podemos compreender o que são os ultra-sons. Para que o nosso ouvido perceba um som é necessário que a frequência dêste  esteja compreendida entre 20 a 20.000 períodos por segundo. Um som será tanto mais agudo quanto maior fôr a frequência. Os sons com frequência, inferiores a 20 períodos são chamados infra-sons e os de frequência superiores a 20.000 são os ultra-sons.

Para a produção dos ultra-sons usam-se diversos aparelhos, o mais perfeito dos quais é o gerador piezoelectronico. Nos insectos, os ultra-sons serão produzidos pela vibração de certas partes do côrpo, sujeitas a um movimento muito rápido que os músculos lhe podem imprimir.

O gerador piezoeléctrico, que foi descoberto ainda há poucos anos, baseia-se no seguinte princípio: se comprimirmos uma lâmina especial de quartzo, esta polariza-se electricamente, o mesmo é dizer que aparece sôbre uma face uma carga positiva e sôbre a outra uma carga igual, mas negativa. Inversamente, se estabelecermos uma diferença de potencial alternativa entre as faces da lâmina de quartzo, esta entrará em vibração.

Os ultra-sons têm já bastantes aplicações. É conhecida a grande importância que estas vibrações têm nas comunicações submarinas e na localização pelo éco, dos corpos imersos. Também na indústria, os ultra-sons são empregados: sob a sua acção se preparam diversos compostos e sistemas coloidais.

Ultimamente, tem-se estudado as acções biológicas dos ultra-sons. Tal como verificou o célebre físico francês Langevin, os peixes são paralisados pelas ondas ultra-sons suficientemente intensas certos ornismos unicelulares, como as paramécias e até mesmo sistemas celulares podem ser brutalmente destruídos pela acção destas vibrações. Éstes fenómenos brutais explicam-se pela variação da pressão que actua sôbre as células. As células são destruídas do mesmo modo que uma bomba de profundidade destrói um submarino - é a enorme e rápida diferença de pressão que se estabelece entre o exterior e o interior do casco que leva à destruição do submersível.

No campo da medicina, tem-se procurado estudar as acções dos ultra-sons, utilizando-os no tratamento de neoplasias superficiais e na preparação de vacinas, mas, por enquanto, as dificuldades técnicas têm impedido tirar conclusões.

Fonte: Revista Ver e Crer nº1 (1945)
Texto: Dr. António Filipe
Foto da Net
Nota: O Texto está escrito na íntegra à época.
© Carlos Coelho