domingo, 4 de janeiro de 2015

Freddie Mercury

O animal de palco que era tímido

“Não serei um astro do rock, serei uma lenda”. A afirmação, de Freddie Mercury, denunciava a antevisão de uma banda rock, formada por quatro amigos de faculdade, que haveria de vender mais de 300 milhões de discos.
A história do cantor cola-se á história dos Queen, apesar da sua vida não se limitar ao seu lugar numa das maiores bandas de sempre. Farrokh Bulsara nasceu na ilha de Zanzibar, em 1946, mas foi na Índia, terra natal dos progenitores, que deu os primeiros passos e foi também ai que se iniciou na música, com aulas de piano, aos sete anos.


Os pais, Bomi e Jer, eram parsis de Bombain e praticavam o zaroastrismo, a religião de Zaratustra, pelo qual Mercury sempre se regeu. O pai havia levado a família para Zanzibar onde o governo colonial britânico lhe dera emprego, mas inscreveram o filho mais velho na escola britânica de Bombaim, St. Peter’s School.


Foi aí que aos 12 anos, encontrou companheiros para formar a sua primeira banda, The Hectics, que faziam covers de Cliff Richard e Little Richard. Quando fez 17 anos, a família mudou-se para Inglaterra, e Farrokh, que era já tratado por Freddie, candidatou-se ao Curso de Arte e Design Gráfico, em Londres. Era um jovem tímido quando, no final da década de 60, passou por várias bandas, nomeadamente Ibex, Wreckage e Sour Milk Sea, que terminaram antes de encontrarem o seu caminho.



Enquanto trabalhava no aeroporto de Heathrow, aumentava o seu interesse pela música, mas só em 1970 daria o passo certeiro. Tim Staffell era seu colega de quarto quando fundou a banda Smile, com Brian May e Roger Taylor. Freddie há muito acompanhava o trajecto da banda, participando e assistindo aos ensaios, por isso, quando Tim deixou a banda, sabia que o lugar seria seu.O carisma do novo vocalista, que rebaptizou a banda, rapidamente o tornou líder incontestado, mas só 1971 encontrariam o baixista ideal para o quarteto: John Deacon. Nasceram os Queen.


A banda ficará par a história da música por conseguir conquistar audiência em espectáculos de massas, onde dezenas de milhares de pessoas respondiam em uníssono a temas que se transformaram em hinos internacionais. Já o lado teatral da banda e a transformação do tímido vocalista em animal de palco quando acendiam as luzes fizeram o resto. “ Eu sou uma prostituta musical”, admitiu uma vez Freddie Mercury, revelando que nem sempre fez a música que mais lhe inspirava a alma.



Apaixonado por homens e mulheres

Foi no inicio da década de 70 que o jovem cantor, que entretanto adotara o nome de Freddie Mercury, conheceu Mary Austin. Apesar de nunca casarem, estava sinceramente apaixonado pela jovem a quem dedicou vários temas, nomeadamente o belíssimo Love of my life. Só quando descobriu uma crescente atração por pessoas do mesmo sexo preferiu terminar a relação, que de imediato se transformou numa bela e honesta amizade. O cantor considerava que Mary era a sua única amiga e foi a sua confidente ao longo dos anos de estrondoso sucesso que se seguiram. “Todos os meus amantes me perguntavam porque não podiam substituir a Mary, mas era simplesmente impossível. É a minha única amiga e para mim, era a minha mulher. Para mim foi um casamento”, explicou já depois do início do sucesso.


O primeiro álbum da banda, intitulado Queen, caracterizava-se por sonoridades bastante pesadas. Queen II, de onde se destaca Seven Seas of Rhye, apresentava já o som mais melódico de Freddie. Foi o terceiro álbum, Sheer Heart Attack, em 1974, que tornou os Queen conhecidos do outro lado do Atlântico. Aquela que é considerada por muitos a sua obra prima foi lançada no ano seguinte. A Night at the Opera vendeu mais de um milhão de cópias e criou um novo estilo: o rock arte que, para além de temas muito complexos, conta com uma superprodução em videoclips e concertos. A day at the Races volta a ser dirigido pela guitarra de Brian may e pela bateria de Roger Taylor, mas inclui Somebody to Love, um dos melhores exercícios vocais de Freddie. Em 1977, News of the World trouxe os grandes êxitos We Will Rock You e We Are The Champions e enche estádios. Os anos 80 trouxeram a electrónica à banda, nomeadamente com o êxito Another One Bites The Dust. Mas, à medida que o sucesso internacional aumentava, Freddie começava a divorciar-se do rock, apostando numa carreira a solo, o que começou a motivar discussões e ameaças constantes entre o grupo.


Apesar de tudo nunca se separaram. Lançaram em 1984 o álbum The Works e fizeram várias digressões internacionais, passando pela América Latina e por África. Nesse mesmo ano, o concerto no Rock in Rio ficou na história da música. A actuação de 1985 no Live Aid, em favor das vítimas da fome em África, perante 72000 espectadores, foi mesmo considerada a maior performance ao vivo na história da música rock.
Nesse ano, depois de ter uma relação com a actriz Barbara Valentin conheceu o cabeleireiro Jim Hutton, que foi o seu companheiro até ao fim.
A digressão do álbum A Kind of magic foi a mais lucrativa da banda, mas o concerto de dia 9 de Agosto 1986, em Inglaterra, que juntou 140 mil fãs, foi quase uma despedida dos palcos. É que pouco depois, Freddie Mercury descobre um caroço no ombro e a biopsia revela-lhe que é seropositivo.

O início do fim

Freddie terá revelado apenas às pessoas mais próximas que tinha HIV, então demonizado pela esmagadora maioria das pessoas. Jim Hutton, o seu companheiro, também soube que era seropositivo em 1990, mas acabou por morrer de cancro, há dois anos.


Apesar de muitos acharem que Freddie Mercury era homossexual, na realidade sentiu-se atraído por várias mulheres ao longo da sua vida. E, apesar da sua exuberância em palco, nunca assumiu publicamente a homossexualidade, que havia sido legalizada no Reino Unido apenas anos antes, em 1967.


Alguns grupos defendem que o cantor devia ter tornado publico que era seropositivo, para poder participar nas campanhas de informação e conseguir angariar fundos para a investigação, mas a verdade é que, apesar de ser muito extrovertido em palco, Freddie Mercury sempre foi muito discreto e particularmente tímido.
Nos últimos anos, dedicou-se a concretizar alguns sonhos artísticos. Lançou o álbum Barcelona, com a cantora de ópera Monserrat caballé, que adorava desde sempre, e The Miracle, com a banda.


O álbum Innuendo foi a preparação da despedida. The Show Must Go On, These Are The Days Of Our Lives, Innuendo e I’m Going Slightly Mad davam já indícios de que seria o último.
A progressiva degradação física do cantor havia já lançado suspeitas de que estava muito doente, quando finalmente decidiu partilhar a verdade com os fãs. ”Resolvi confirmar ao público as suspeitas que a imprensa tem levantado há algumas semanas: eu tenho sida e tenho lutado contra esta doença há alguns anos. Espero que daqui para a frente todos se consciencializem e se unam para enfrentar este terrível mal”. Morreu menos de 24 horas depois de fazer o comunicado, dia 24 de Novembro de 1991, de uma broncopneumonia.


O funeral foi privado, de acordo com os princípios zoroástricos e, tal como havia desejado, foi cremado e as suas cinzas foram dispersadas em local incerto. Por não haver um túmulo, os locais que marcaram a sua vida, nomeadamente a sua casa, transformaram-se em memorial e ainda hoje são visitados por milhares de fãs. Fiel a quem amava, deixou grande parte dos royalties e a mansão a Mary Austin, com quem havia casado, pelo menos ideologicamente. “ Se tivesse sido minha mulher teria tudo para ela”, justificou, dividindo o resto da fortuna entre a família e o companheiro.
Com o apoio de Jim Hutton e da amiga de sempre, passou as ultimas semanas na sua casa, em Kensington.


Ao perceber que o processo era irreversível, decidiu deixar de tomar a medicação, para acelerar o fim. “ Eu não tenho a mínima vontade de viver até aos 70 anos, acho que seria enfadonho”, disse em tempos. O destino fez-lhe a vontade.

Fonte: Revista VIP
Texto: Elizabete Agostinho
Fotos da Net

CarlosCoelho