“De tão pessoais e únicas
crenças resulta o efeito perverso de não serem facilmente partilháveis, de não
se conseguirem construir como referenciais minimamente estáveis e os de
pertenças e interacções sociais.”
De há uns anos para cá
tornou-se moda um conjunto de formas de estar, de algum modo “alternativas”, em
que se mistura, a maioria das vezes atabalhoadamente, uma simpática psicologia
positiva e simplificada, resquícios fisiológicos orientais, práticas antigas de
cariz divinatório e mais umas coisitas entre o místico e o mágico.
No conjunto, a ideia é tão
boa como outra qualquer e serve, no essencial, para as pessoas que lhe concedem
centralidade viverem o melhor que podem, acreditando que umas quantas práticas
lhes fazem bem e qua o acesso a uns tantos conhecimentos lhes garante aquele
patamar de originalidade que as torna especiais.
Sendo dado que o facto de
nos sentirmos detentores de uma qualquer verdade nos fortalece a auto-estima e
o amor-próprio, em princípio nada há a opor e essas novas convicções que têm a
particularidade de serem á medida e personalizadas, já que cada um escolhe o
que lhe faz mais sentido.
De tão pessoais e únicas
crenças resulta, entretanto, o efeito perverso de não serem facilmente
partilháveis, de não se conseguirem construir como referenciais minimamente
estáveis e organizadores de pertenças e interacções sociais. Ou seja, corre-se
o risco de aumentar a incomunicabilidade e de usar retalhos de conhecimentos
curiosos para distanciar os outros que não têm o mesmo tipo de
‘esclarecimentos’ e ‘iluminação’. E nas fés auto-erigidas há sempre elementos
incompreensíveis, já que espelham personalidades, desejos e medos únicos e
intransmissíveis.
O agradável de crenças e
referências antigas e organizadas é que nos ajudam a distinguir os próximos dos
distantes, implicam-nos na partilha do que há em comum, estabelecem-nos
pertenças e enquadram-nos em redes em que não estamos sozinhos.
Não sendo a solução para
todos os problemas e acarretando os seus próprios disfuncionamentos, ter uma
religião, um clube, um grupo, uma cor ou uma nação é uma escolha de contacto,
que a história do mundo mostra ter inegáveis vantagens.
Crenças individualizadas e
fragmentadas, por seu turno, se destacam originalidades e idiossincrasias
interessantes, também isolam os seus autores e põem a nu, com excessiva
facilidade, confusões e angústias fundamentais. Sendo as pessoas o que são,
quer dizer, seres de origem e vocação social, que muito mais facilmente
descobrem o bem-estar no encontro com o outro do que numa zona de solidão
altiva e hermética, dava jeito que não se exagerasse na elegia da originalidade
e dos caminhos alternativos.
Fonte: Revista Caras
/Psicologia
Texto/autor: Por Isabel Leal
/ Professora de Psicologia Clínica no ISPA
Foto da net
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