quarta-feira, 7 de março de 2007

Maria da Fonte

Pela Santa Liberdade – A Maria da Fonte foi grito de revolta do povo e arma de arremesso na luta pelo poder.

Uma boa medida para defender a saúde pública acendeu o rastilho de uma revolta que, a partir do Minho, incendiou todo o Norte de Portugal, fez cair sucessivos governos e deu origem a uma guerra civil que só acabou com a intervenção de exércitos estrangeiros. Os ódios políticos chegaram a por em causa a honra de D. Maria II, acusada em alguns jornais – em Portugal e Inglaterra – de ser amante do ministro Costa Cabral.

(Maria da Fonte)

O temido jornalista e líder revolucionário Rodrigues Sampaio traçou a fronteira entre oposição e canalhice: “O paço dos nossos reis é um foco de corrupção política, mas não é de corrupção moral.”

Em Abril de 1846 Lisboa assustou-se com as notícias de um levantamento popular no Minho. Os incidentes tinham começado a 19 de março, no Lugar de Santo André de Frades, concelho de Póvoa do Lanhoso. Quando o pároco se preparava para fazer o funeral a uma mulher no cemitério local – em obediência ao decreto de 26 de Novembro do ano anterior, conhecido como “lei da saúde”, que proibia os enterros nas igrejas, para evitar focos de epidemias -, um grupo de mulheres armadas de chuços e foices roçadoras obrigou-o a cumprir a tradição, sepultando a morta no interior do templo.

Nos dias seguintes, outros funerais foram interrompidos da mesma maneira até que o administrador de Póvoa de Lanhoso mandou prender três mulheres da aldeia de Fonte de Arcada, onde morava a que fora apontada como a cabecilha das desordens: uma tal Maria da Fonte. Quando as três detidas estavam a ser levadas para a sede do concelho, saiu ao caminho um grupo de vizinhas que pôs em fuga os polícias e libertou-as.

(Costa Cabral)

Ao longo do mês de Abril, os distúrbios multiplicaram-se. Os funcionários do fisco que andavam pela região a fazer inquéritos para determinar o imposto a pagar pelos moradores tornaram-se no alvo preferido dos bandos armados. Quando as notícias chegaram ao Porto e a Lisboa, davam conta de uma rebelião que se estendia do Minho a Trás-os -Montes, chefiada por Maria da Fonte, que encabeçava as insurrectas armada com duas pistolas.

A revolta das minhotas foi o pretexto ideal para juntar os inimigos do Governo autoritário de Costa Cabral, chefe do partido cartista, que representava a direita moderada. Não por acaso, os chefes das guerrilhas que fizeram frente às tropas enviadas pelo Governo eram padres, como Casimiro José Vieira (imortalizado pelo seu seguidor e cronista Camilo Castelo Branco), saudosistas do absolutismo do Rei D. Miguel.

(D. Maria II)

Aos miguelistas juntaram-se os setembristas (a esquerda radical do regime) e até cartistas descontentes, numa aliança contranatura cimentada pela oposição a Costa Cabral. Este, a 20 de Abril de 1846, pediu e obteve suspensão das garantias constitucionais e enviou ao Porto o seu irmão José, ministro da Justiça, com plenos poderes para esmagar a revolta.

O rei do Norte, como lhe chamavam os adversários, lançou uma campanha repressiva, mas falhou o objectivo. A situação agravou-se em todo o país e a Rainha D. Maria II acabou por ser obrigada a demitir o Governo e a mandar os Cabrais para o Exílio em Espanha (20 de Maio).

(Tropas dirigidas por José Cabral aplicam vergastadas a um popular durante a Patuleia)

As disputas entre os novos senhores do poder – os Duques de Palmela, Terceira e Saldanha – não tardaram. Ingovernável, o país mergulhou na Guerra Civil que ficou conhecida como Patuleia) da “pata ao léu”, pés nus dos camponeses), entre Outubro de 1846 e Junho de 1847. Os revoltosos chegaram a dominar todo o Norte de Portugal e só depuseram as armas depois da intervenção militar espanhola e inglesa. Costa Cabral regressou ao poder pouco depois, o que deu origem a nova instabilidade política que só terminou em 1851, com a Regeneração.

(Póvoa de Lanhoso oferece estátua a Maria da Fonte)

A Maria da Fonte ficaria na memória pela lenda e por várias evocações artísticas. A maestro Ângelo Frondoni compôs uma marcha, a Maria da Fonte ou a do Minho, que viria a ser o hino do Partido Progressista (que reuniu os herdeiros do setembrismo e da patuleia). O refrão cantava: Eia avante, portugueses/Eia avante não temer / Pela santa Liberdade/ Triunfar ou perecer!

Fonte: Revista Notícias Sábado

Texto/autor: João Ferreira

Fotos da Net



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