Como nasceu a República
Fez-se de convicções, combates ferozes nas ruas e perseguições implacáveis. Saiba como viviam e se atacavam com vigor os portugueses da época.
(Foto, O Passado Resistiu Paiva Couceiro, líder da resistência Monárquica. E a monarquia, representada no trono – composta e senhorial -, de ceptro e coroa, ladeada pelo rei.)
“Eram homens de convicção. Dinâmicos, crentes, apóstolos daquilo em que acreditavam. Estas figuras [de 1910], revolucionários e contra-revolucionários, estavam no extremo oposto ao dos políticos de hoje. Que são pragmáticos, cínicos, operacionais.” Assim define Jaime Nogueira Pinto os líderes republicanos e monárquicos, que se enfrentaram nas ruas, no Parlamento e nos jornais, fez agora 100 anos… lutando até á morte pelos dois regimes em confronto. O autor de Nobre Povo – Os Anos da República, editado pela Esfera dos Livros, descreve a época: “Havia um clima de grande crispação, de paixões políticas violentas, cujo grau máximo de intensidade foi o regicídio, dois anos e meio antes da Implantação da República”. Os chefes dos dois campos “tinham uma visão idealista e romântica… achavam que iam mudar a História do país”.
O investigador, doutorado em Ciências Sociais pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa, explica-nos que tinha mais influência onde… “Os republicanos”, esclarece, “tinham uma forte implantação em Lisboa e em algumas áreas do Porto -na classe média dessas zonas. E algum protagonismo nos quadros subalternos do Exército e da marinha: uma vanguarda política importante”. O grosso do país rural, as gentes do campo, constituíam-se de católicos e conservadores. “Os republicanos conseguiram canalizar o apoio que tinham e conquistar o poder.”
(Foto,
Amélia santos na Rotunda da Avenida)
O autor de A Direita e as
Direitas não acredita que o republicanismo tenha sido um movimento
económico e social. “Só que havia fundamentos da monarquia que estavam em
causa. A república tinha a força da novidade, o que foi decisivo no seu
triunfo.”
A política do final da
primeira década do século XX era assim: o rei D. Manuel II era jovem (tinha 20
anos), estava traumatizado pela morte do pai e do irmão no regicídio e era
dominado pela mãe, pela avó e pela corte. “A todos faltava mais bravura”,
na opinião de Nogueira Pinto.
António Teixeira de Sousa, último primeiro ministro da Monarquia Constitucional, que “caiu” em 1910 estava “obcecado” pelo medo da Direita. Assim, “não estava muito virado para reprimir os republicanos”. Os partidos da monarquia tinham muitas rivalidades entre si e estavam marcados pelo assassinato do rei (D. Carlos) e do filho (o Príncipe D. Luís Filipe), dois anos e meio antes.
Machado dos Santos, pouco conhecido hoje, “foi ‘a’ figura: o homem-chave do 5 de Outubro. Ele foi a vontade e a acção. Embora isolado das elites, impõe-se pela revolução, da qual ele foi o centro”. Com o autor de Nobre Povo ficamos a saber como eram os nossos “primos” naquela altura: os jornais. Eram sobretudo ideológicos, políticos, alimentando os dois lados que se debatiam com ferocidade. Tinham uma forte carga polémica. Eram mais destinados a formar militantes, a “convencer os convencidos”. Não havia a preocupação de informar.(Foto,
Exilio de D. Manuel lI, visto por um jornal da época.)
O escritor de O Fim do
Estado Novo e as Origens do 25 de Abril fala-nos também de Fernando Pessoa.
“Era visceralmente anti Afonso Costa [um predominante líder e estadista
republicano]. Era muito crítico, hostil e agressivo em relação a ele. E não há,
na intelectualidade [escritores] da época, um grande entusiasmo pela
república.”
Perguntamos a Jaime Nogueira
Pinto se acredita que a República trouxe mais liberdade. Resposta: “Não. Foi
a mesma coisa… aliás, durante a Monarquia Constitucional havia liberdades
públicas. Essa foi talvez a época mais aberta. Mais do que a República.”
Nesta, afirma, “havia liberdade para os republicanos”, mas foi “retirada
aos católicos e monárquicos”. As prisões “estavam cheias” de presos
políticos, de direita e de esquerda. “Até houve um comité político em Londres,
pedindo a libertação de presos políticos portugueses.” Jornais da oposição eram constantemente
atacados por grupos armados. “A contradição entre o proclamado e o acontecido
foi um dos grandes problemas da Primeira República”, finaliza.
Inquietação
Como se vivia na época? Intensamente.
Na Europa tinha terminado a Belle Époque. Chegavam a Grande Guerra, o comunismo
e o fascismo. Em Portugal, o tempo era de costumes nada brandos. Eram dias de
marinheiros nas ruas, militares na política, povo nas trincheiras. Padres a
combater, civis a armar-se como podiam.
Líderes a sério
O que nos revela o
investigador? Jaime Nogueira Pinto faz a crónica de um dos tempos mais agitados,
apaixonantes e trágicos da História de Portugal. Anos de líderes fortes,
polémicos e carismáticos, como Afonso Costa ou Sidónio Pais. E de idealistas
convictos, como Machado Santos ou Paiva Couceiro.
Um tempo perdido
Se recuássemos 113 anos,
ficávamos baralhados: era um tempo… entre dois tempos! Com carros de cavalos e automóveis,
mensageiros e telefones, sindicalistas e futuristas. Lanças e canhões, eleições
e bombas, conspirações de quartel e café, jornalismo ideológico e fraudes
financeiras. Marcado por pronunciamentos militares, golpes de estado, revoltas
e revoluções. Animado pela luta política entre livres-pensadores e católicos,
republicanos e monárquicos, moderados e radicais.
Política e emoção
De que fala Nobre Povo – Os Anos da República, de Jaime Nogueira Pinto, editado pela Esfera dos livros? Na manhã de 5 de Outubro de 1910, em Lisboa, um movimento revolucionário derrubou a monarquia e proclamou a república democrática. Volvidos 16 anos, oito presidentes e 45 Governos, o Exército, revoltado, marchava sobre a capital para pôr fim à Primeira Républica.
(Foto, Sidónio e Afonso,
Afonso Costa e Sidónio Pais, inimigos inconciliáveis: as duas figuras mais
carismáticas e simbólicas da Primeira República.)
Factos da 1ª Década
1910 –
Os “motores” da vitória republicana no 5 de Outubro de 1910 foram:
Machado Santos – Foi
o chefe militar rebelde.
Teófilo Braga –
Presidiu o 1º Governo Provisório da República Portuguesa.
Início Trágico: na
véspera morreram o chefe civil e o líder militar do 5 de Outubro, Miguel
Bombarda e Cândido dos Reis.
A marca distintiva da
Primeira República: foi a “guerra” contra a Igreja Católica.
Factores de sucesso do 5 de
Outubro de 1910: a Artilharia da Rotunda, os marinheiros e a
inacção do Governo.
A maçonaria:
(sobretudo o Grande Oriente Lusitano), teve influência determinante na
preparação da revolta.
Paiva Couceiro,
monárquico, simbolizou a resistência à República.
1911 – O
Partido Republicano Português divide-se em diferentes partidos.
1914 –
II Guerra, 1914-18 – Portugal assumiu neutralidade no início, mas enviou
expedições militares para Angola e Moçambique.
1916 –
Portugal entra na guerra mais activamente. Tamagnini de Abreu comandou o
Corpo Expedicionário Português.
1917 – Lenine,
desencadeia, com sucesso, em Petrogrado, na Rússia a revolução de Outubro.
13 de Outubro,
foi a última aparição da Virgem aos pastorinhos. Fortaleceu o catolicismo
popular.
5 de Dezembro,
rebenta em Lisboa uma revolução comandada por Sidónio Pais. Cai o 3º
Governo de Afonso Costa.
1921 –
19 de Outubro, em Lisboa, bandos de marinheiros e guardas republicanos
capturaram e liquidaram dirigentes republicanos como: António Granjo e Machado
Santos.
Fonte: Revista Nova Gente
Texto/autor: Vasco Ventura
Fotos da Net
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