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sábado, 5 de novembro de 2016

Elvas

Sabe qual é a cidade do Mundo com o maior conjunto de fortificações do tipo Baluarte?
É Elvas, na planície alentejana, com Badajoz à vista e, por via dessa vizinhança e das invasões castelhanas que por lá vinham, cedo transformada em praça-forte.
Pois esta singularidade foi recompensada pela UNESCO, que, de entre 33 candidatas, fez da cidade raiana portuguesa Património da Humanidade.
A região alentejana passou a contar com dois títulos de Património Mundial: o centro histórico de Évora e as fortificações de Elvas.
O orgulho dos elvenses é indisfarçável, já que de mero ponto de passagem a caminho de Espanha, a sua cidade se transformou em local de paragem quase obrigatória dos turistas nacionais e estrangeiros.

(A batalha aqui travada em Janeiro de 1659 teve importância fundamental na Guerra da Restauração.)


As poderosas defesas de Évora remontam ao reinado de D. Sancho II, no século XIII. Porém, o que lhes confere carácter único são as muralhas em estrela, construídas no século XVII segundo o estilo desenvolvido pelo engenheiro francês Vauban e que desempenharam papel inestimável durante a Guerra da Restauração, pela qual Portugal garantiu a sua Independência após 60 anos de união ibérica. Do monumental conjunto defensivo fazem ainda parte os Forte de Santa Luzia e da Graça e o Aqueduto da Amoreira.

Aqueduto da Amoreira

Forte de Santa Luzia

Forte da Graça 

A propósito: as famosas ameixas de Elvas serão os frutos deste nome, que inegavelmente existem na região, ou os projécteis disparados das fortificações sobre um inimigo condenado a não passar?...

Fonte: Revista Visão
Texto/Autor: Desconhecido
Foto da Net
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quarta-feira, 28 de setembro de 2016

D. João de Castro

Um Génio raro


Cientista excepcional, militar brilhante, grande administrador: mas o que fez de D. João de Castro um caso raro foi, sobretudo, a sua indiferença perante as riquezas materiais.

Viveu apenas 48 anos de 1500 a 1548, segundo se julga, embora não haja uma certeza absoluta quanto ao ano de nascimento. É , em todo o caso, bem pouco tempo, se comparado com tudo o que este homem fez, sempre ao serviço da coroa, primeiro no Norte de África e depois na Índia, de que foi governador e vice-rei.
Ainda hoje, para todos aqueles que retêm na memória um pouco da história Portuguesa, D. João de Castro é uma figura familiar. Sobretudo por causa do segundo cerco de Diu, que ficou famoso, e após o qual ele quis dar a própria barba como penhor de um empréstimo destinado a reconstruir a fortaleza, que ficara completamente destruída. Mas, justamente porque o episódio não está esquecido, não vamos insistir sobre Diu nem sobre os outros feitos militares de D. João de Castro; focaremos antes, aqueles aspectos, hoje menos conhecidos, da sua vida e da sua personalidade, a começar pelos trabalhos científicos, sobretudo nos domínios da geografia e das ciências náuticas.

TINGIS,LVSITANIS,TANGIARA
(Tânger, a gravura de Braun e Hogenberg de 1572, foi a praça onde o futuro 14.º governador e 4.º vice-rei da Índia se estreou nas armas e onde mereceu a distinção de ser armado cavaleiro.)

Diga-se antes de mais, que este homem recebeu, na infância e na adolescência, uma excelente educação; tal como o infante D. Luís, irmão de D. João III, teve, entre outros mestres, o muito célebre Pedro Nunes. No entanto a ciência, para ele, teria de esperar: como qualquer outro moço fidalgo, frequentador da corte (o pai era governador da Casa do Cível e vedor da fazenda real), a sua primeira actividade foi guerreira e desenrolou-se no norte de África – ele próprio escreveu, aliás, que “em África me nasceram as barbas”. Foi para lá com 18 anos e  só regressou nove anos mais tarde, mas já era então alguém: reconhecendo o seu valor, D. Duarte de Meneses, governador de Tânger, armara-o cavaleiro e recomendara-o por carta a D. João III. Cumpriu depois outras missões navais e militares; e finalmente, em 1538, embarcou para a Índia na armada do vice-rei D. Garcia de Noronha, seu cunhado, que devia ir socorrer Diu, prestes a sofrer o primeiro cerco.

Viagem científica

Segundo se pensa, esta missão de D. João de Castro era mais científica do que militar. Haveria diversas matérias em cujo estudo a coroa portuguesa estava interessada – entre elas, a determinação rigorosa das longitudes e latitudes em alto mar e a qualquer hora do dia, uma questão com incidências políticas e diplomáticas porque estava em causa a delimitação das áreas de influência de Portugal e Castela no Oriente, em cumprimento do tratado de Tordesilhas; e esta era apenas uma parte do “programa” científico dessa primeira viagem para a Índia. 

Três dos desenhos incluidos por D. João de Castro nos seus famosos "roteiros"

(Porto de Dabul)

(Rio e povoação de Chaul)

(Ilustração do roteiro de Goa a Diu)

No seu cumprimento, a actividade de D. João de Castro, a bordo do navio Grigo, foi verdadeiramente espantosa: observou e descreveu fenómenos naturais, aves e peixes; estudou o regime dos ventos e as correntes; descobriu algo da maior importância, ou seja, que as agulhas das bússolas sofrem desvios quando se encontram na proximidade de massas metálicas – o que acontecia facilmente num navio profusamente guarnecido de peças de artilharia. E com tudo isto e muito mais, recolheu os elementos que lhe permitiram elaborar o primeiro dos seus célebres roteiros, itinerários acompanhados de mapas, ilustrações e informações diversas, que ainda hoje impressionam quem os estuda.

Esse roteiro inicial, De Lisboa a Goa (1538), foi imediatamente seguido por outro, De Goa a Diu (1538-1539), o que tem uma clara lógica; depois de a armada do novo vice-rei chegar a Goa, os turcos decidiram levantar o cerco a Diu, mas D. Garcia de Noronha quis, ainda assim, deslocar-se até lá e D. João de Castro acompanhou-o, comandando uma galé; deste modo, teve a oportunidade de prosseguir o seu trabalho cartográfico. Quanto ao terceiro roteiro que chegou até nós (pois terá havido um outro que se perdeu), elaborou-o quando após a morte de D. Garcia, o seu sucessor no governo da Índia, D. Estêvão da Gama – filho de Vasco da Gama, comandou uma expedição a Suez para tentar destruir as naus turcas. Esse objectivo não foi conseguido, porém da viagem, em que D. João de Castro comandou o galeão Coulão Novo, sairia, como ficou dito, mais um roteiro, de Goa a Suez, também conhecido como Roteiro do Mar Roxo (1541).


Todos estes trabalhos não são, evidentemente, best-sellers da literatura light mas, nos meios científicos, deram ao seu autor uma reputação, a nível europeu, de grande cientista – hidrógrafo, cartógrafo, observador e, até, filósofo.

Os amigos

O rei D. João III (em cima, a sua estátua em Coimbra) sempre reconheceu o valor de D. João de Castro. Por isso o nomeou como vice-rei.

(O Infante D. Luís, irmão do rei D. João III, foi um amigo de toda a vida)



Um homem tão Excepcional teve também amigos excepcionais. Mencione-se o infante D. luís, um dos príncipes mais inteligentes que houve em Portugal; e o ilustre Pedro Nunes, não só o seu mestre, mas também um amigo. 

O célebre matemático Pedro Nunes, foi mestre de D. João de castro e, mais tarde seu amigo

Outros amigos eram o Conde de Castanheira, o melhor ministro de D. João III, e D. Rodrigo Pinheiro, que foi arcebispo de Braga. Na Índia, D. João de Castro viria a suscitar a amizade e a ardente admiração de D. Cristóvão da Gama, o jovem filho do navegador, que viria a morrer na Etiópia.

E, no fim da sua vida, travou forte amizade com S. Francisco Xavier; este foi um dos seus confessores que assistiram ao seu pensamento.

(S. Francisco Xavier assistiu aos últimos momentos do vice-rei)


Qualidade rara

Quando D. João de Castro regressou à Índia, que entretanto deixara em Janeiro  de 1542 para voltar a Portugal, talvez não previsse que regressaria em breve aquela terra, dessa vez como governador – nomeação  que terá aceite a contragosto, julga-se que por insistência do infante D. Luís. Era um cargo espinhoso e de muitos trabalhos; ele desempenou-o no entanto com brio e ânimo: Em breve teve de enfrentar nova ameaça da praça de Diu – foi o tão celebrado segundo cerco, em que D. João perdeu o seu segundo filho, D. Fernando: Depois de ter libertado a praça e derrotado decisivamente o inimigo, e depois de ter iniciado as obras de reconstrução da fortaleza – a história das barbas… -, regressou a Goa onde entrou à maneira dos antigos triunfadores romanos, com a maior pompa e circunstância que se possa imaginar. Mas, seguramente, este triunfo à romana era simplesmente ditado por razões políticas; porque também   muito seguramente a nossa história conhece bem poucos chefes militares que fossem tão ascéticos, tão indiferentes à ostentação, tão modestos nos seus hábitos como este homem que pouco comia, ainda menos dormia, que em campanha vivia como qualquer soldado e que se gastava em trabalho – terão sido, aliás, estes excessos de renúncia, esta dureza para consigo próprio, que apressaram o seu fim.
Feitas as contas, os nós governo da Índia durou somente cerca de três anos, porém esse período foi muito rico em acontecimentos – e, vamos lá, em heroísmo. Já no final, veio de Lisboa ordem real que lhe prolongava o mandato, mas agora com a dignidade de vice-rei D. João de Castro gozou esta dignidade durante escasso tempo: morreu a 6 de Junho de 1548, assistido, nos seus últimos momentos, por S. Francisco Xavier.
Sim: apesar de tudo, apesar dos “fumos da Índia”, esse ainda era um tempo de heróis e de santos…

A Renúncia ao Ouro



Esta foi a característica mais extraordinária de um homem que teve inúmeras oportunidades para enriquecer. De regresso do seu serviço de nove anos em Tânger, não pediu ao rei qualquer mercê. Em 1535, quando Carlos V lançou uma ofensiva contra Tunis, com o auxílio Português, D. João de Castro tomou parte da expedição, com o infante D. Luís. No final, o imperador resolveu pagar dois mil ducados a cada capitão, mas ele recusou-se a receber esta quantia. Recusou também, na sua primeira partida para a Índia, a capitania de Ormuz. É verdade que aceitara, antes, a comenda de Salvaterra, mas fê-lo, ao que parece, somente pela honra, já que o proveito – ou seja, o rendimento – era muito reduzido. Tanto quanto se sabe, apenas pediria ao rei uma mercê: algum terreno em Sintra, para “arredondar”, digamos assim, a área da sua quinta da Penha Verde, que era património herdado. 

(A Quinta da Penha Verde em Sintra, era o principal património de D. João de Castro e também o seu refúgio)

Por outro lado, o episódio da barba, dada como penhor, tem uma explicação: na época a barba era um símbolo de honra e de prestígio varonil; ora, ao terminar o cerco de Diu, D. João de Castro não tinha consigo nem fortuna nem valores, porque gastara tudo na defesa e na governação da Índia. 

(A Ermida de Nossa Senhora do Monte, mandada construir na quinta por D. João)

Só tinha a honra para dar como penhor. Enfim, já pouco antes da sua morte, teve de pedir que a administração lhe fixasse um pequeno subsídio para se manter, pois gastara, mais uma vez, todos os seus fundos em navios, armamento, etc.                                                                                              
Fonte: Revista Super Interessante
Por: João Aguiar
Carlos Coelho

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Um Português Rei do Pegú

Salvador Ribeiro de Sousa

Um português rei do Pegú

No rico país da Birmania, onde até há pouco ardeu cruenta a guerra e, no seu govêrno de Pegú, foi outrora Rei um grande Capitão português.
Alma de aventureiro gentil-homem, coração ardente, sequioso de aventuras que lhe mitigassem as ansiedades de glória, Salvador Ribeiro de Sousa largara da sua aldeia de Quintães, de Entre Douro e Minho, para Militar na Índia com dois dos seus irmãos.

Portugal jazia sob o jugo castelhano. Não devia ser agradável a vida na pátria, vendo-se a tôda a hora os inimigos seculares passeando seu orgulho aos olhos de cavaleiros que os valiam ou sobrepassavam.
Havia lá longe, largos campos de luta, onde as espadas portuguesas pudessem vingar-se em bárbaros das vanglórias dos castelhanos. Aquêle fidalgo de poucos teres, arribado ao Ganges, no verão do ano de 1600, pensou em ir mais além do que era costume das hostes da conquista. Ela já estava feita: tratava-se, agora, de colher os resultados dos esforços anteriores.


Existiam, porém, terras de muita fama, de que falavam histórias, corridas de bôca em bôca, com o sabor de lendas. Tudo quanto se conhecia de fabuloso, desde as pedrarias rutilantes, que os rajás prodigalizavam, até ás preciosas cargas de produtos exóticos alucinavam as imaginações dos chatins que viajavam, correndo riscos pelas riquezas e dos capitães em busca de triunfos e também de opulência.

Chegado ao porto de Sirião, o cavaleiro português antevia a glória e o lucro. Pensou em edificar uma feitoria naquele local, e, para isso teve de solicitar licença do Rei de Arracão. Já estava naquelas paragens, um europeu, para demais nascido em Lisboa, de pais franceses, e que se chamava  Felipe de Brito Nicote. Foi ele o intermediário para a concessão. Como por milagre os poucos portugueses que acompanharam salvador Ribeiro de Sousa construíram rapidamente a feitoria que era, ao mesmo tempo, fortaleza.


Entrou em aborrecimentos o monarca de Arracão, pressentiu possível hostilidade do cavaleiro e voltou com a palavra atrás. Não queria fortes nas suas terras: desejava muito longe delas os estrangeiros e ameaçou-os de extermínio se não destruíssem imediatamente aquele monstro de madeira e pedra que fazia larga sombra ao seu reino.
A-pesar de não contar com muitos elementos de combate, o gentil-homem de Entre o Douro e Minho não lhe sofreu o ânimo aguardar o ataque do Rei bárbaro. Foi ao seu encontro demonstrando que não o temia. Dispunha de três barcos e artilhou-os; tinha consigo pouco mais de cinquenta portugueses e mostrou-lhes a glorificação do seu nome e da pátria. Encontrou peitos leais e rijos como habituados por corações leoninos e forrados de aço.

A frota imponente do soberano de Aracão subia o rio de Pegú em som de guerra, tripulada pelos melhores guerreiros e que desdenhavam dos pobres baixeis do inimigo. Em breve, destroçados e cheios de pasmo, julgando ter-se batido com as fúrias dos infernos, os peguanos mal tinham voz para contar o que de susto os tolhia.
Grandes foram os despojos colhidos na aventurosa batalha. Arranjou-se com que aumentar a defesa do forte; não faltaria viveres nem pólvora; tampouco riquezas. Os vencidos tinham-se encarregado de as fornecer e, mais ainda, de aumentar o ânimo dos portugueses. Se com três barcos destroçavam uma armada, aquela fortaleza seria inexpugnável em suas mãos!

Já vinham as grandes mesnadas do Banha Lão para acometer quem os desonrara; formigavam os soldados bem apetrechados, à maneira indígena, e seus gritos de guerra ressoavam terrivelmente. Pareciam mais fortes de língua do que de braço.
Salvador Ribeiro de Sousa, fazendo uma sortida, quando eles o julgavam cercado, rompe as fileiras peguanas, estilhaçou as defesas, calcou cadáveres, pôs fogo á tenda de campanha e, apanhado o  Banha Láu, matou-o e mostrou sua cabeça decepada aos soldados abatidos. Os portugueses tinham desprezo por tanto gentio aniquilado. Poderiam vir mais, muitos mais, desfazer-se contra a fortaleza todo o reino que, eles lá estavam para o conter. Não tardou nova investida comandada por Banha Dalá, genro do assassinado. Desta vez não foi fácil a vitória; tornou-se mais apertado o cerco e quando da nova sortida, o cavaleiro português retirou a custo, retalhada a sua face por um golpe qua a marcaria desde a orelha esquerda até à bôca.


Apareceram no rio, embora a distância, brancas velas que pareciam anunciar socorros de europeus. Não passavam de barcos de traficantes que iam em busca de negócios pingues. Serviram para amedrontar o inimigo, com a ardência que Salvador Ribeiro de Sousa lhes comunicou, na batalha travada, as tropas do Dalá sofreram derrota que lhes enfraqueceu o ardor. Retiraram; e, naturalmente, como os derrotados tinham por costume e lei abater os generais, e até os reis, vencidos, ficou vago o trono. O Rei do Pegú fôra assassinado. Prestou-se alto preito ao vencedor, cuja fama alastrava pela Indo-China. Os peguanos elegeram-no seu Rei e uma vistosa embaixada lhe foi oferecer a corôa em grandes galas.

Seria ele o Massinga, o soberano. Sorriu-lhe o desfecho da aventura. Imaginava talvez que seria um bom Rei naquelas terras onde chegou, ao acaso de uma arribada. Deixou-se aclamar, folgou dignamente nos festejos, nobilitou os seus cavaleiros, amigos e aderentes e preparou-se para fundar uma dinastia.
Muitos anos depois Voltaire diria que «o primeiro Rei do Mundo foi um soldado feliz». Salvador Ribeiro de Sousa ganhou batalhas e no seu sangue derramado colhera uma corôa: a do Pegú.
Mandou um embaixador a Aires de Saldanha, vice-rei da Índia e aguardou a sua sanção a tantas vitórias.


Andava, porém alguém a tecer uma teia negra: o Nicote. Tantas coisas dissera e de tal maneira influíra no espírito do vice-rei, que ele o nomeou capitão general da conquista feita pelo grande guerreiro, que ficaria subalterno do intrigante.



Na carta que Aires de Saldanha lhe escrevera lia-se: «A Salvador Ribeiro de Sousa, Capitão da Fortaleza de Sirião, na ausência de Felipe de Brito Nicote». Os usurpadores sempre medraram. Quando aquele chegou, o nobre cavaleiro arremeçou-lhe a coroa com os insultos e embarcou na nau que o conduziu ao reino, triste e desolado sentindo decerto que mais ganham os habilidosos e lisonjeiros do que os altivos e esforçados.


Chegou ao reino, onde acabaria com sua Comenda de Cristo, por único galardão e a lembrança de mil ingratidões.

Fonte: Revista Ver e Crer nº 2 de Junho 1945
Texto: Rocha Martins
Fotos da Net

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© Carlos Coelho

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Machado de Castro


Ganha fama com a escultura de D. José, colocada em Lisboa no Terreiro do Paço em Abril de 1775. Escultor e estatuário nascido a 19 de Junho de 1731, cumpre-se esta semana a 17 de Novembro o aniversário da sua morte (1822). 
De Coimbra vai para Lisboa, onde aprende com o mestre Nicolau Pinto a arte de esculpir. Rapidamente a sua fama ultrapassa a do mestre e passa a trabalhar com José de Almeida, protegido do Rei D. João V. trabalhou 14 anos nas obras da Basílica de Mafra.

Fonte: Revista Focus
Fotos da Net
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sábado, 5 de janeiro de 2008

A Lusitânia

 História de Portugal

A Lusitânia

Os lusitanos, vulneráveis antepassados dos portugueses, viviam na orla ocidental da Ibéria. Duas fronteiras naturais os confinavam, a norte e a sul – o Douro e o Tejo. Primitivamente, aquele era o nome de uma simples tribo, que pelas suas qualidades de energia e tenacidade na defesa, se tornou mais notada dos estranhos. O nome generalizou-se a outras tribos, depois a outros povos limítrofes, que, todavia, não divergiam muito pelos caracteres étnicos. Estavam nesse caso os calaicos, que habitavam ao norte do Douro, nas terras altas do Noroeste.

Os dados antropológicos, embora precários, porquanto os nossos antepassados usavam a cremação, são, contudo, conducentes a provar que eles eram os descendentes da população neo-eneolítica da região. Influências culturais tinham-nas recebido de outros povos, que vieram comerciar, e até estabelecer colónias e feitorias, nos pontos periféricos da Península. Ainda no século XII a.C. os fenícios, que então possuíam o monopólio do comércio no Mediterrâneo, haviam fundado Gades (Cádis). Nesse entreposto, como em outros que depois foram surgindo, recebiam dos naturais da Península o produto das suas riquezas mineiras, que eles não sabiam aproveitar, e trocavam por artefactos e produtos do Levante. Málaca (Málaga) e Hispalis (Sevilha) foram de fundação fenícia. O nome de Lisboa “Olissipo” parece de origem fenícia. Significaria “baía formosa”. No século VII a.C., começaram os gregos a desapossar os fenícios do domínio do comércio peninsular. Sagunto, na costa oriental da Espanha, foi uma das cidades por eles fundadas.

(Aníbal, militar e homem de estado cartaginês. Pormenor de pintura de 1527 (Museu de Clermont-Ferrand.)

A invasão Céltica do século VI a.C., foi mais profunda, embora muito menos importante em benefícios de civilização. É uma primeira invasão dos bárbaros do Norte, dez séculos antes das grandes migrações medievais. Um ramo dos célticos estabeleceu-se ao norte do Douro, ocupando ainda parte da Galiza. Outro fixou-se na região de entre Tejo e Guadiana. Mas a terra montanhosa a que depois se chamou Algarve, extremo sudoeste da Meseta, continuou a ser habitada pelos cúneos ou cinetes.

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Os Lusitanos

“[…] A norte do Tejo fica a Lusitânia, a maior das tribos ibéricas e que foi combatida pelos romanos durante muito tempo. A lado Sul da Lusitânia forma-o o Tejo; os lados oeste e norte, o oceano; o lado leste, carpetanos, Vetões e Calaicos […] Umas trinta tribos habitam o território entre o Tejo e os Ártabros. Apesar de o território ser rico em frutos e gado e pela quantidade de ouro, prata e outros metais, a maior parte dos habitantes, deixando de viver da terra, viviam do roubo e em guerra permanente […], até que os Romanos acabaram com isto, sujeitando-os e transformando a maior parte das cidades em povoados não fortificados […]. Os lusitanos são muito inclinados a sacrifícios e examinam as entranhas, mas sem as extraírem […]. Também cortam as mãos dos prisioneiros e dedicam as direitas aos seus deuses […]. Tomam as suas refeições sentadas, tendo bancos de pedra dispostos em redor dos muros. Dão a presidência aos de mais idade e categoria social. Lançam do alto dos rochedos os condenados á morte e apedrejam os que mataram os seus pais, fora das cidades ou além-fronteiras. Casam-se com os Gregos.”

In Geografia, III de Estrabão

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Certos termos célticos persistiram na linguagem das populações do país, sobretudo na composição dos nomes de cidades e povoações, como por exemplo o elemento briga, que aparece em Conímbriga e Caetóbriga. Aquele termo significava “monte fortificado”. As povoações dos lusitanos, como as dos antigos romanos, eram edificadas em eminências do terreno, para mais fácil defesa. Os inúmeros castros (crastos na linguagem popular), restos de povoações fortificadas no cimo de colinas, e que se encontram no nosso país de Norte a Sul, não são de proveniência romana, como se julgou. Já existiam, havia muito, antes da romanização da Península e com ela receberam aquela designação de castros, e ainda as de citânias e cividades.

Pelo mesmo tempo que se produz a invasão céltica, as costas peninsulares são afanosamente procuradas pelos mercadores cartagineses, que em vários pontos fundam estabelecimentos ou povoações, absorvendo muitas das antigas colónias dos seus parentes fenícios, designada então por Tartessos. Os novos exploradores de Espanha dominam toda a Bética (Andaluzia), e são levados a pensar na conquista militar da Península, quando expulsos pelos romanos da Sicília e das ilhas próximas, na chamada Primeira Guerra Púnica. A ocupação do litoral do Mediterrâneo é feita por Amílcar Barca, notável chefe militar, que tem de ir subjugar, no Ocidente, as tribos revoltadas dos lusitanos (238 a.C.).  morre em plena guerra com os vetões, povo que vivia no planalto de Castela. Seu genro Asdrúbal, por um governo de brandura, conciliação e alianças, firma a posição dos cartagineses na Ibéria. Estabelece a capital numa povoação por ele fundada à beira do Mediterrâneo, em face da Á

África, Nova Cartago (Cartagena).

A Asdrúbal sucede no governo da Espanha cartaginesa um filho de Amílcar, o arrojado Aníbal, que submete todo o Ocidente peninsular. No litoral do antigo país dos cúneos (Algarve), funda Portus Hannibalis (Portimão ou Alvor).

Um conflito entre Sagunto, aliada de Roma, e várias cidades aliadas de Aníbal, dá aos romanos o pretexto para o início da luta que deveria por termo ao crescente império dos cartagineses (Segunda Guerra Púnica). Aníbal toma Sagunto, marcha para a Itália, vence os romanos em canas e vai repousar nas delícias de Cápua, não se atrevendo a assaltar Roma. O senado romano, porém, decreta a destruição do poderio cartaginês ordenando a conquista da Espanha (218 a.C.).

(Cipião, o Africano, ao apoderar-se de Nova Cartago, completa a conquista do litoral mediterrânico.)

Na conquista da Ibéria distinguem-se uma série de generais romanos, pertencentes á mesma família, a dos Cipiões. Públio, Cornélio, Cipião, chamado “o Africano” pelas suas vitórias em África, completa a conquista do litoral mediterrâneo, apoderando-se de Nova Cartago (210 ou 209 a.C.).

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Juramento de Viriato

“ Os Lusitanos, carecendo ao princípio de um chefe apropriado, apresentaram-se aios romanos como fácil presa na sua luta; mais tarde, quando tiveram Viriato por chefe, infligiram grandes reveses aos Romanos. Este era, por certo, um dos Lusitanos que viviam junto ao mar oceano e, sendo pastor desde criança, viveu habituado à vida na montanha […] Acostumou-se a comer pouco, fazendo muitos exercícios, a dormir apenas o necessário e, resumindo, inseparável das suas armas e mantendo lutas com feras e ladrões, tornou-se famoso entre o seu povo, sendo eleito seu chefe […] Saindo vitorioso nos combates, fez-se admirar pelos seu valor e gozou também fama de excelente general […] nunca se mostrou como um bandido, mas como um chefe, e lutou contra os Romanos, vencendo-os em muitas batalhas […]

In Biblioteca Histórica, XXXIII, 1 de Diodoro Siculo

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Mas os povos do interior mostraram-se insubmissos. A luta torna-se feroz. Por 193 a.C., os lusitanos fazem valer a sua bravura. Derrotam um outro Cipião. No Ocidente Ibérico, Roma encontra uma resistência que só subjugará ao fim de longa e pertinaz luta. O pretor da Espanha, Sérvio Galba, é por eles vencido e vinga a derrota com uma tremenda matança de lusitanos, que astuciosamente atraíra com promessas de aliança perpétua (150 a.C.).

Mas o enérgico povo do Ocidente reage. Tem por chefe Viriato, um pastor, como pastores são os montanheses que o elegeram.

Entre os lusitanos o processo favorito de combate é o de guerrilhas. Os romanos, habituados a combater em campo raso, qualificam o processo de desleal. Chamando-lhe latrocinium.

(Legionários romanos assaltam a cidade. Baixo-relevo da coluna de Marco Aurélio (Museu da Civilização Romana, Roma).

O guerreiro lusitano usava um escudo redondo com dois pés de diâmetro, que suspendia do pescoço, e brandia o punhal, a lança de ponta de bronze, o alfange curvo, dardos de ferro. Vestia cota de linho sobre a qual trazia o sagum (manto grosseiro que descia ao joelho), preso com uma fíbula. Usava em geral os cabelos compridos e soltos, atando-os com uma fita durante o combate; frequentemente protegia a cabeça com capacete cónico, de couro. Batalhava tanto a pé, como a cavalo. Exercitava-se continuamente nos jogos de destreza, no arremesso do dardo, no pugilato, na equitação, em combates simulados.

Viriato organiza um exército regular e invade a Turdetânia, no Sul da Península, vencendo as hostes romanas (146 a.C.). Depois de vários anos de guerrilhas, em que os soldados de Roma não levam a palma, o chefe lusitano trata a paz com o governador Quinto Fábio Serviliano. Um outro Cipião, Quinto Servílio, leva o Senado romano a anular a paz e encarrega-se de prosseguir a luta. Mas não consegue vencer pelas armas o caudilho do Ocidente. Suborna três dos companheiros de Viriato, que o assassinam (139 a.C.).

(Morte de Viriato. Quadro de Jose de Madrazo y Agudo (Museu Nacional do Prado)

Morte de Viriato

“Audaz, Ditalco e Minuro, da cidade do Urso, vendo que o grande prestígio de Viriato estava sendo afectado pelos Romanos, temeram por si mesmos e decidiram prestar aos romanos um favor mediante o qual pudessem obter a sua própria segurança […] Sabendo que Viriato estava ansioso por acabar com a guerra, prometeram-lhe que convenceriam Cipião a firmar um acordo de paz se os enviasse como embaixadores para negociar o fim da luta. Como o chefe o consentisse de muito bom grado, apresentaram-se ante Cipião e facilmente o persuadiram que lhes concedesse garantia de segurança mediante promessa de que assassinariam Viriato. Uma vez que deram e receberam por outro lado garantias sobre o tratado, regressaram prontamente ao acampamento; depois de anunciar que tinham convencido os Romanos no referente á paz, deram a Viriato enormes esperanças, ao tanto se empenharem em afastar o mais possível da sua mente o verdadeiro propósito. Acreditados por ele mercê da amizade, depois de entrarem durante a noite ocultamente na sua tenda e matarem Viriato com golpes certeiros de espada, escaparam rapidamente do acampamento e, valendo-se de caminhos intransitáveis pela montanha, chegaram salvos ao encontro de Cipião.”

in Biblioteca Histórica, XXXIII, 21 de Diodoro Siculo

(Monumento a Viriato em Viseu)

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Dezenas de anos se passam sem que o governo de Roma posso considerar-se senhor absoluto do Ocidente da Ibéria. Na Itália estala a guerra civil, o conflito entre Mário e Sila. Mário nomeia propretor da Espanha um partidário seu, Sertório (83 a.C.), o qual é pouco depois destituído por Sila, quando este alcança o poder. Sertório vagueia, fugitivo, pelas costas do Sul e pela África, até que no ano de 80 a.C., os lusitanos o convidam a tomar a direcção da resistência contra Roma. O novo chefe chega a derrotar o grande Pompeu (76 a.C.), mas de regresso á Lusitânia é vítima de traição de Perpena, seu lugar-tenente. Este, que numa correria pelas terras do Norte conquistara Cale, já então romana, conjurou-se com outros lusitanos e assassinou Sertório num banquete (72 a.C.).

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Lusitanos e Portugueses

“Temos examinado as relações que se poderiam dar entre nós e aquela porção de tribos célticas denominadas de lusitanos. – Qual é o resultado de tudo o que fica dito? – que é impossível ir entroncar com elas a nossa história ou delas descer logicamente a esta. Tudo falta; a conveniência de limites territoriais, a identidade da raça, a filiação da língua, para estabelecermos uma transição natural entre esses povos bárbaros e nós.

[…] Por outra parte é evidente que a antiga raça céltica, não só da Lusitânia, mas também de qualquer outra parte da Península, se corrompeu, desaparecendo por fim na sucessão de tantas invasões e conquistas como as que passaram por este solo. É sobretudo em virtude do domínio romano que transformou radicalmente a sociedade.”

In História de Portugal, de Alexandre Herculano

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(Júlio César, o grande Imperador romano. Pintura de Alexandre Abel de Pujol.)

Caio Júlio César, o grande César, vem governar a Espanha em 61 a.C.. Saqueia várias cidades da Lusitânia, que lhe ofereceram resistência. Essa resistência manifesta-se sobretudo no Norte. Os pastores do Hermínio (Serra da Estrela [?]) descem às terras baixas, sendo batidos e repelidos até ao mar. mas as cidades do Sul recebem o enviado Senado amigavelmente. Nessas, a romanização começara já a fazer-se. César honra-as, dando-lhes o nome. Scallabis (depois santarém) passa a denominar-se oficialmente Praesidium Julium. Olissipo transforma-se em Felicitas Julia, Ébora em Liberalitas Julia. No local da moderna Beja, funda César uma nova povoação, Pax Julia.

A guerra entre Pompeu e César repercute-se em Espanha. César vem várias vezes à Península para submeter os partidários daquele. Num dado momento a Bética é o reduto dos filhos de Pompeu, que, após a morte do pai, ainda resistem. O ditador de Roma vence-os definitivamente em Munda (45 a. C.).

Ao morrer, sob os golpes dos conjurados Júlio César deixava a Espanha submetida, mas não inteiramente. Nas Astúrias, na Galiza, incluindo a região de Entre Douro e Minho, ainda dominava a rebeldia. É Octaviano Augusto que vem pessoalmente ao Ocidente da Península completar a obra de submissão (25 a.C.). Brácara (depois Braga) recebe o qualificativo de Augusta, que é dado a outras cidades da Espanha. A Península está, finalmente, pacificada, e em breve tempo a romanização é completa. As instituições políticas e administrativas são impostas. Mas os costumes, a linguagem, a religião são adoptados pelas populações. A Espanha é em tudo uma província do Império. Cada povoado de certa importância torna-se um município à maneira romana, em que o povo tem direitos soberanos. Garantem-se os interesses locais – o que estava nos hábitos de gente lusitana.

Parte da população da Lusitânia, a das serranias do Centro e do Norte, vivia da pastoreação. Alimentava-se de glandes de carvalho, que reduzia a farinha para fabricar pão. Nas terras baixas dispersava-se uma população de agricultores, que cultivavam a vinha e os cereais – trigo, centeio, cevada-, criavam gados e fabricavam manteiga. No litoral e nas margens dos rios, onde mais densamente se agrupavam, alimentavam-se também de peixe e de marisco. Para a pesca serviam-se de embarcações de couro ou de troncos escavados e afeiçoados como barcos. O azeite servia-lhes para untar os corpos, tornando-os mais ágeis para os exercícios físicos.

Já usavam as águas minerais como terapêutica. Apesar de fabricarem o vinho, mostravam-se sóbrios. Bebidas prediletas eram a água, o leite de cabra e a cerveja de cevada. Só nos festins usavam o vinho. Bebiam por vasos de madeira. A sua cerâmica era um tanto primitiva; não conheciam a princípio a roda do oleiro: modelavam à mão vasos sem ornatos de grande simplicidade, meras incisões, e estampavam-nos ou pintavam-nos.

Vestiam-se de lã ou de pele de cabra, os homens de negro, as mulheres de cor. Ornavam-se com colares, manilhas, arrecadas, braceletes e outras joias de ouro, trabalhadas por martelagem ou pelo processo da filigrana.

Conímbriga

“[…] será preciso preocupar-se, nos edifícios particulares, com o modo como se devem situar as diversas peças destinadas ao uso exclusivo ao dono da casa, e como serão as que são comuns com os estranhos […]. Nas peças que se chamam reservadas, como os quartos, salas de jantar, banhos e outras destinadas a usos semelhantes, não podem entrar todos, mas apenas os que tiverem sido convidados. Ao contrário, nas chamadas comuns pode entrar qualquer pessoa, mesmo sem ser convidada, tais como nos vestíbulos, átrios, pátios […]. Para as pessoas de fortuna medíocre não são necessários vestíbulos magníficos, nem grandes salões, nem átrios, porque essas pessoas vão cortejar as outras, enquanto a elas ninguém as vem procurar […]. Ao contrário, para advogados e homens de letras as casas devem ser elegantes e amplas, capazes de receber muitas pessoas. Finalmente para os nobiles e para os que, no exercício dos seus cargos ou magistraturas, devem conceder audiência aos cidadãos, devem construir-se vestíbulos sumptuosos, jardins e áleas de acordo com o decoro e respeitabilidade das pessoas, e para além disso com bibliotecas, pinacotecas e basílicas instaladas de maneira que possam rivalizar em magnificência com os edifícios públicos; porque com frequência nestas casas realizam-se assembleias ou reuniões particulares, ou ainda julgamentos arbitrais.”

Vitrúvio

Viviam em casas pequenas, que no Norte eram circulares e no restante quadrangulares, edificadas de pedras soltas, sendo os pavimentos térreos.

Os cadáveres eram cremados. Todavia, os lusitanos praticavam o culto dos mortos. Professavam um politeísmo confuso, usando o sacrifício de animais. Representavam, em esculturas rudimentares, os seus guerreiros e os seus deuses.

Com a romanização, o tipo de construção das habitações modificou-se. Adoptou-se a telha para os tectos, os tijolos e mosaicos para os pavimentos.

Templos Romanos

“a composição da construção dos tempos, depende da simetria, cujas regras devem, por isso, ser observadas pelos arquitectos. Nasce a simetria da proporção que os gregos chamam analogia. A proporção é uma correspondência de medidas entre uma determinada parte das componentes de cada obra e os eu conjunto: desta correspondência depende a relação das proporções […] Do mesmo modo, as partes de que se compõem os edifícios sagrados devem ter correspondência exacta em dimensões entre cada uma das suas partes e a sua total magnitude […]. Será períptero aquele [templo] que tenha tanto na fachada como na parte posterior seis colunas e em cada lado, onze [o de Évora apenas tinha nove colunas de cada lado], incluindo as dos ângulos, separadas das paredes da nave pela mesma distância que entre elas, formando assim em redor; no interior do templo, um lugar próprio para passear, como no pórtico de Metelo, o templo de Júpiter Stator; construído por Hermodoro, e o edifício de Mário […] no templo da Honra e do Valor; obra de Murcio.”

In Da Arquitectura de Vitrúvio.

A Lusitânia beneficiou enormemente da cultura romana. Teve templos, teatros, circos, termas, pontes, aquedutos, vilas, arcos de triunfo e estradas militares de modelo romano. De Olissipo partiam três estradas para Augusta Emérita, Capital da Lusitânia, a Mérida actual, passando uma por Caetóbriga (Setúbal), salácia (Alcácer do Sal) e Ébora; outra por Scallabis; outra por Aritium (?). para o Norte seguia a que terminava em Brácara. Lisboa era assim o centro de uma rede de vias, embora não fosse a capital da divisão jurisdicional a que pertencia – o conventus scallabitanus (sede em Scallabis).

(A Torre de Centum, em Belmonte, é uma construção romana, de planta rectangular, volume único e três pisos sobre a qual ainda hoje, de concreto, muito pouco se sabe.)

O latim vulgar, falado pelos soldados romanos, generalizou-se; passou a ser a língua da Península, perdendo-se a tradição dos antigos falares. O desenvolvimento económico foi considerável. As indústrias primitivas progrediram na calma segurança da Paz Romana.

A cristianização desta província do Império começou cedo. Já a perseguição de Nero (século I depois de Cristo) atingiu os cristãos da Espanha. Os primeiros propagadores da nova fé foram os mercadores e navegadores do Mar do Levante que visitavam as costas da Ibéria. Quando da perseguição de Diocleciano (304), houve mártires em Olissipo, Brácara e Ébora. No tempo do Império Constantino (século IV) o cristianismo recebeu consagração oficial com o Édito de Milão, e a Igreja organizou-se na Espanha ao mesmo tempo que na Itália. Na segunda metade do século, a Lusitânia estava dividida, eclesiasticamente, em quatro dioceses, pelo menos: Brácara, Olissipo, Ébora e Ossónoba (Faro).

(Vista parcial das termas de São Cucufate, localidade no actual Alentejo onde se encontram vestígios de três fases de construções romanas.)

Súmula e actualização

Mescla étnica

Na Península Ibérica, como em outras Penínsulas, deu-se a sobreposição, ao longo do tempo, de numerosas civilizações correspondentes a povos cujo movimento migratório era aqui interrompido pelo mar. os vestígios arqueológicos são abundantes no território português, e revelam presença de populações desde o Paleolítico superior (há cerca de 500 000 anos), documentando-se todas as sucessivas técnicas do trabalho da pedra até ao período dos metais.

A riqueza mineira atrai exploradores de cobre e estanho desde os inícios da idade do bronze. O castro de Zambujal, em Torres Vedras, construído por recolectores de metais vindos do Oriente, é o mais antigo vestígio da exploração económica do território. Ligadas com as influências orientais estão as duas culturas mais típicas do ocidente peninsular: a cultura megalítica, caracterizada por construções de grandes pedras, e a cultura campaniforme, na região do Tejo, caracterizada por vasos cerâmicos em forma de campânula. Desde os inícios do primeiro milénio a.C. verificaram-se sucessivas invasões de povos originários do centro da Europa (Celtas) que já usavam instrumentos de ferro e eram hábeis artífices do Ouro (as actuais arrecadas do Minho são uma sobrevivência dessa técnica). Esses povos misturaram-se com as populações já instaladas, e originaram as tribos celtibéricas. Os Lusitanos são celtiberos que viviam entre o Douro e o Tejo. Para norte do Douro viviam os Calaios, também de origem céltica.

(Évora: Templo romano, século I. O aparecimento de um fragmento da estátua da divindade feminina (mão com romã) permite saber que se trata de um templo consagrado à Deusa Juno.)

Domínio Romano

Em 219 a.C.  desembarcaram na Península Ibérica as primeiras tropas romanas, e cerca de duzentos anos depois toda a Península (com excepção do País dos Bascos) estava submetida e romanizada. Foi especialmente difícil a submissão da Lusitânia, tendo ficado célebre a resistência de Viriato, Chefe dos Lusitanos. A acção colonizadora romana eliminou quase completamente as diferenciações culturais e linguísticas, e conduziu á formação de uma população homogénea: a população hispano-romana. A anterior organização económico-social dos povos indígenas (baseada nas tribos, propriedade colectiva e economia de subsistência) foi substituída por uma organização colonial. Todo o território foi organizado com vista á exploração dos recursos locais: agricultura articulada com a exportação dos principais produtos (sobretudo o vinho), exploração de minérios, pesca e exportação de peixe conservado em sal.

Generalizou-se o emprego da moeda como instrumento de troca; havia várias cunhagens de moeda local. A unidade agrícola predominante era a vila, constituída por um núcleo de terras férteis que o proprietário explorava directamente com escravos e por parcelas dispersas, cultivadas por colonos semilivres que entregavam uma parte da produção ao proprietário da vila; com a decadência económica do século III, a situação dos colonos aproximou-se da dos escravos. Uma rede de estradas, a construção de pontes e a acção da administração conferiam unidade social às províncias romanas: a Galécia, co capital em Brácara, a Lusitânia, com capital em Mérida.

José Hermano Saraiva

Fonte: Enciclopédia História de Portugal -Vol 1

Autor/Texto: Ângelo Ribeiro /José Hermano Saraiva

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