Como os mapas eram feitos antes da invenção do satélite?
Antes das imagens de
satélite, como os geógrafos, cartógrafos e povos mais antigos faziam mapas? Sem
a precisão da visualização elevada, como chegávamos às representações do
terreno? Para chegar ao resultado final nos mapas, era necessário arte,
exploração, inventividade matemática e um pouco de imaginação. Além de auxílios
visuais e guias de navegação, mapas do passado também lidavam com o
desconhecido — de formas curiosas e criativas.
Como muitas respostas da
ciência, a solução para a fabricação de mapas pode soar chata e pouco
interessante, mas ela nada mais era do que muito, muito tempo e trabalho.
Diferente de hoje, período no qual vemos novas tecnologias surgindo a cada ano,
os desenvolvimentos científicos eram bem menos numerosos, com um ritmo de
avanço bastante lento.
Era necessário ver gerações
de geógrafos, exploradores, matemáticos, viajantes, historiadores, cartógrafos
e outros estudiosos juntar seus conhecimentos para produzir informações novas
sobre os locais do mundo — isso gerava mapas feitos com medidas mais ou menos
realistas, mas também com muita especulação. Para entender como os mapas
chegaram ao ponto da cartografia logo antes do desenvolvimento dos satélites, é
útil estudar sua história.
História dos mapas
Uma das primeiras
representações de todo o mundo conhecido (à sua época, é claro) foi a obra de
Anaximandro, um filósofo pré-socrático (611-547 a.C.) considerado um dos 7
sábios da Grécia. Seu mapa era circular e deixava a Grécia no centro do mundo,
mostrando partes da Europa, sul da Ásia e norte da África. Para ele, esses
continentes se encaixavam em um círculo envolvido por água, e, mais importante,
faziam parte de uma Terra que (realmente) se acreditava ser plana.
No século I a.C., no entanto, o polímata grego Eratóstenes de Cirene já conseguiu provar que a Terra não é plana, chegando a calcular sua circunferência com uma precisão incrível para a época. Ele comparou resultados de pesquisas extensas da Biblioteca de Alexandria, também fazendo suas próprias observações.
(Reconstrução do século XIX
do mapa do mundo feito por Eratóstenes, mundo este até então conhecido, c. 194
a.C.)
Para tal, foi medido o
tamanho das sombras feitas por um graveto segurado na vertical, ao mesmo tempo,
em cidades diferentes. O raio produzido pela distância norte-sul entre as duas
cidades, calculado a partir das sombras, deu o ângulo necessário para calcular
a circunferência e o raio da Terra.
Eratóstenes também criou um
método para posicionar locais mais precisamente nos mapas — o sistema de grade,
parecido com o que usamos atualmente, mas que nesse caso dividia o mundo em
duas partes. A rede de linhas ajudava a medir a distância entre os lugares já
conhecidos. O polímata ainda dividiu o mundo conhecido entre 5 zonas
climáticas: duas temperadas, duas congeladas a norte e sul e uma tropical, no
centro, formada pelo Equador. Já era um mapa bem mais sofisticado.
A geografia de Ptolomeu
Nos séculos seguintes,
gregos e romanos continuaram a juntar informações para seus mapas, usando
informações de viajantes e exércitos expedicionários. Com isso, o astrônomo
grego Cláudio Ptolomeu produziu uma obra em 8 volumes chamada Geografia,
incluindo mapas.
Famoso, seu trabalho influenciou estudiosos europeus e islâmicos por muitos séculos. Compilados em 150 d.C., os mapas em si não traziam novidades, já que se baseavam em obras anteriores, mas Ptolomeu fez o favor de incluir o método que utilizou para produzi-los, ajudando quem quer que fosse reproduzir o esforço cartográfico.
(O mapa de Ptolemeu,
reconstituído da sua obra Geografia (ca. 150), indicando as nações
"Sérica" e "Sinas" (China) à direita, além da ilha
Taprobana (Seri Lanca) e a "Quersoneso Áureo" (península do Sueste
Asiático). Este mapa usa a projeção cônica equidistante meridiana, inventada
por Cláudio Ptolomeu.)
Isso não quer dizer que ele
não tenha contribuído à ciência — além de coordenadas detalhadas de mais de
8.000 lugares conhecidos pelo astrônomo, ele também introduziu a ideia de
latitude e longitude, usadas por nós até hoje. A Geografia chegou à Europa no
século XV por Constantinopla, sendo reinterpretada por estudiosos.
Os islâmicos, por exemplo, inverteram a orientação do norte como topo do mapa em sua própria obra, e especialistas como Muhammad al-Idrisi se basearam nesse trabalho para fazer mapas muito influentes para os exploradores e cartógrafos franceses, italianos e holandeses até meados do século XVIII.
(A Tabula Rogeriana,
desenhada por al-Idrisi para Rogério II da Sicília em 1154, um dos mapas
mundiais medievais mais avançados. Consolidação moderna, criada a partir das 70
páginas duplas de al-Idrisi, mostradas de cabeça para baixo, já que o original
tinha o Sul no topo.)
Cristóvão Colombo, por exemplo, foi bastante influenciado pelas descrições de Ptolomeu da Ásia, ainda que fossem bastante imprecisas. Foi por isso, em grande parte, que o navegador acreditava estar indo em direção a riquezas facilmente acessíveis quando buscou circunavegar o planeta — com um resultado já conhecido. Quem realmente conseguiu circunavegar o planeta de verdade foi Fernão de Magalhães, há mais de 500 anos.
(Os mistérios do mapa de
1491 que guiou Cristóvão Colombo, O mapa Mundo desenhado por Henricus
Martellus, que terá orientado Cristóvão Colombo.)
Antes do fim, uma revolução
Antes da chegada dos
satélites, que mudariam a cartografia para sempre, outra revolução ajudou na
fabricação dos mapas — a bússola magnética. O ser humano já conhecia o
magnetismo há muito tempo, mas foi só em torno do século XIII que a aplicação
do conceito em aparelhos confiáveis se tornou possível.
Os mapas antes dessa invenção ficaram obsoletos, e foi criado o mapa portulano, uma espécie de guia náutico. Ele ajudava os viajantes a ir de porto a porto, já que seu desenho era feito para poder ser visto de qualquer ângulo — cada porto tinha uma rosa dos ventos própria, se ramificando por todo o mapa, facilitando o cálculo da viagem de um lugar a outro.
(As mais antigas
cartas-portulano: Carta Pisana (c. 1275) e a de Giovanni da Carignano (c.
1307).)
Foi em um mapa portulano, inclusive, que foi desenhada a primeira rosa dos ventos. Era o Atlas Catalão, feito por cartógrafos para o rei francês Carlos V ao compilar muitos outros mapas. Embora a autoria seja pouco clara, acredita-se que o judeu maiorquino (da ilha de Mallorca) Abraão Cresques tenha sido o responsável.
(Pormenor
do Atlas Catalão (c. 1375).)
Seu mapa é uma ótima
representação temática de como se pensava que fosse o mundo, cheio de detalhes
importantes de locais reais, mas também incluindo desenhos fantásticos de
sereias e criaturas lendárias diversas. Ter muitas fontes acabava gerando a
inclusão de mitos e histórias de viajantes, com monstros marinhos e dragões e,
muitas vezes, terras lendárias apenas especuladas, nunca visitadas.
Com o aperfeiçoamento dos
métodos de checagem e refinamento das medições, os próximos séculos viram o
surgimento de mapas mais precisos e úteis, sem tanta fantasia — é seguro dizer
que, antes dos satélites, que tiraram a primeira foto espacial do mundo em
1959, tínhamos mapas precisos, sim. Só levava muito mais tempo para fazê-los,
mesmo com a advento de fotografias aéreas.
Fonte: Facebook
Texto: Manuel Beninger
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