Uma “Lady” inesquecível
Impossível esquecer a personagem que a celebrizou: Eliza Doolitle,
uma pobre florista mal educada, refilona, tagarela e com um forte sotaque
cockney que, em My Fair Lady, o professor Higgins quer transformar numa senhora
de alta sociedade. Depois de muito cantar The Rain In Spain Stays Mainly in the
Plain, Higgins lá consegue transformer a gata borralheira numa verdadeira
princesa.
A atriz deu voz às famosas canções do filme e ficou chocada quando
viu que tinha sido dobrada por Marni Nixon, o que a fez ficar insegura, porque
a sua escolha para interpretar Eliza, imposta ao realizador George Cukor, não tinha
sido pacífica.
Este queria que o papel principal fosse atribuído a uma jovem
estrela ascendente da Broadway, Julie Andrews (que nesse ano foi nomeada para o
Óscar de melhor actriz com o filme Mary Poppins).
Apesar de todos estes contratempos, Audrey Hepburn fez de My Fair
Lady um dos filmes mais emblemáticos da história do cinema, e ficou, ao longo
da sua carreira, para sempre associada à imagem juvenil de Eliza.
Uma beleza que desobedecia aos padrões da Época
No Auge da carreira de Audrey, nos anos 50, o corpo franzino, mas
esbelto, os seios pequenos e as ancas estreitas iam contra os padrões de beleza
das estrelas mais famosas da altura, como Marilyn Monroe (que chegou a ser
proposta para protagonista de Boneca de Luxo) e Elizabeth Taylor, mulheres de
seios fartos e ancas bem torneadas. No entanto, o seu ar de maria-rapaz,
assexuado quando comparado com as sex-symbols da altura, conquistou todos.
Talvez devido à sua aparente fragilidade, os actores que eram escolhidos para
contracenar com Audrey ou eram mais velhos ou tinham ar de másculo e paternal.
Humphrey Bogart (em Sabrina), Henry Fonda (em Guerra e Paz), Gary Cooper (em
Ariane),Cary Grant (em Charada), Rex Harrison (em My Fair Lady) ou Sean Connery
(em A Flecha e a Rosa) foram alguns dos seus pares românticos na tela.
O que mais fascinava os realizadores em Audrey era o seu porte
majestoso embora humilde, os eu longo e belo pescoço de cisne, os seus olhos
tristes, mas sobretudo, os eu rosto expressivo, para alguns só comparável ao de
outras actrizes europeias, as igualmente grandes Greta Garbo e Ingrid Bergman.
O rosto de traços geométricos, a elegância e a fotogenia de Audrey
desde cedo chamaram a atenção dos editores das revistas de moda. Foi sete vezes
capa de uma das mais importantes publicações americanas, a “Life”, proeza só
igualada por Marilyn Monroe.
De Princesa a Anjo-da-Guarda
Com o seu porte elegante, o rosto perfeito – dizia o realizador
Billy Wilder: “Deus beijou o rosto de Audrey… e ei-la” – e um olhar doce e
meigo, era impossível que Audrey não tivesse um papel de princesa no primeiro
filme americano que protagonizou, ao lado de Gregory Peck, o adorável Férias em
Roma, que lhe valeu um Óscar.
Edda Kathleen Van Heemstra Hepburn-Ruston pertencia, de facto, à
aristocracia, pois era filha de uma baronesa Holandesa e de um banqueiro
Britânico, nascida na Bélgica em 1929, teve uma adolescência difícil na Holanda
ocupada pelos nazis, que destruíram o seu sonho de se tornar bailarina. O
encontro com a escritora Colette, que insistiu que ela fosse a sua Gigi na
Broadway, seria o primeiro passo na sua carreira de actriz. Daí em diante, os
êxitos bateram-lhe à porta: Sabrina, Cinderela em Paris, Boneca de Luxo, entre
outros.
Aos 60 anos, no seu último filme, Sempre, de Steven Spielberg, etérea,
de branco vestida, Audrey encarnou a personagem que sempre pareceu: um anjo.
Filha de uma baronesa holandesa e de um banqueiro britânico, Audrey
tinha para oferecer a Hollywood a distinção que faltava às americanas. O seu
porte elegante, a sua graciosidade e os eu rosto perfeito, que Billy Wilder
considerou uma dádiva divina, fizeram o resto.
Uma “Boneca de Luxo” humilde e generosa
Desde os tempos de “Sabrina” quem desenhava a roupa que Audrey usava
nos filmes era Givenchy. Em “Quando Paris Delira” na foto e “Cinderela em
Paris”, com Fred Astaire aparece elegante e sofisticada como sempre.
Se a sorte lhe sorriu em termos profissionais, na vida pessoal
Audrey não foi muito feliz. Casada duas vezes, a primeira com o actor Mel
Ferrer, a segunda com o neurologista italiano Andreia Dotti, teves grandes
dificuldades em concretizar um dos seus maiores desejos: ser mãe. Ao longo da
sua vida teve cinco abortos espontâneos, que nem o nascimento de dois filhos
ajudou a ultrapassar.
Fumava muito e perdia muito peso, ela que já era bastante
magra. Talvez devido à sua dificuldade em engravidar, e pelo seu visível amor
pelas crianças, em 1987 foi oficialmente nomeada embaixadora da boa vontade da
UNICEF, uma organização para a qual anteriormente tinha contribuído, ajudando a
angariar dinheiro. Nesta qualidade, viajou por todo o mundo, de Macau ao Japão,
passando pela Etiópia, Honduras e Guatemala, levando ajuda financeira e a
doçura do seu sorriso às crianças.
Já afectada pelo cancro no cólon que a viria
a matar, empreendeu a mais difícil dessas viagens, à Somália, onde a extrema
pobreza que viu a marcou profundamente. A quatro meses do seu 64º aniversário,
a doença venceu-a após um longo período de sofrimento. Audrey Hepburn morreu na
sua casa, na Suíça, onde viveu nos últimos anos. A princesa tornava-se,
finalmente, um anjo.
Fonte: Revista Caras
Fotos: Atlantis Press / AEI
CarlosCoelho